O futebol é um desporto apaixonante, que desde muito novo me cativou. Tenho as minhas preferências, que nunca escondi, mesmo sabendo como o país se fanatiza nessa questão, ao abrigo de uma suposta maioria social tingida a vermelho, ou no chapéu azulado de uma ridícula guerra entre norte e sul, opondo mouros e cristãos. O país é demasiado pequeno para essa visão, sem fundamentação histórico-cultural, restringida que está a um antiquíssimo e delicado equilíbrio de forças entre o centro e a periferia, a capital e o resto do “reino”, o centralismo versus regionalismo – que encontrou na relevância conferida ao desporto-rei um extraordinário veículo de comunicação, empurrado pelas massas que gravitam, sobretudo, em torno dos três principais clubes nacionais.
No futebol tudo se tem misturado. Rui Pinto abriu a caixa de pandora de inúmeras situações, nacionais e internacionais, das quais se falava em surdina, expondo os vícios de um sistema profundamente sórdido: corrupções, tráfico de influências, lavagens de dinheiro, envolvimento de magistraturas… enfim, quase tudo o que é mau parece ter tentáculos no fenómeno do futebol, seguindo impune e pulverizando a sua essência: a habilidade de pelo menos 22 jogadores em conduzir a bola para dentro de uma baliza.
Por estas razões, continuo a estranhar algumas temáticas que marcam o nosso futebol: como explicar que Jorge Jesus tenha prescindido do melhor marcador do campeonato nacional do ano passado? Que dizer do valor das comissões pagas pelo FCP na intermediação de transferências de jogadores? Qual o poço de petróleo que tem levado dinheiro ao SCP?
Podia ficar por aqui, mas a minha qualidade de português, e de pessoa atenta ao meio futebolístico, não pode deixar de anotar a perigosidade dos caminhos sinuosos que teimamos a trilhar: apesar dos feitos da nossa seleção, os clubes começam a fraquejar no contexto europeu. Se o ano passado tivemos o desastre Krasnodar a ensombrar o prestígio azul e branco, este ano levámos a dobrar com os acidentes do PAOK e do LASK desfazendo, precocemente, as ambições internacionais de águias e leões.
Se a isto juntarmos a queda no ranking, as consequências trazidas pela Covid, com reflexos na indústria do futebol, a guerra tradicional no seio da arbitragem, onde se procura controlar as nomeações contando espingardas, ou o apoio de Costa a Vieira (ou vice-versa?) semelhando compadrio, teremos muita lenha disponível para ir queimando – até que um dia se conclua que a floresta deu lugar a um mar de cinzas, quiçá, sem possibilidade de reversão.