A água foi e é um dos nossos símbolos de vida: foi boa para beber, fazer andar os moinhos, alimentar chafarizes e lavadouros, transportar pessoas e bens; transformou terras inférteis em terras de semeada, a génese de vinhas, pomares e muitos verdes. Hoje, ainda continua a ser um dos centros primordiais da vida humana.
Aqui vai a água que desce dos penhascos da Serra
Extravasando pelas fendas, apertada nas frestas estreitas,
Gemendo e chorando pelas veredas por si abertas, acarreando sais minerais,
Afeiçoando os férteis torrões onde se planta tudo o que vai dar de Comer à dor dos pobres, e os abastados enriquece.
A levada que atravessa os lugares
É um ribeirinho sem margens,
Canta, baila, clama p’ los homens,
Para que juntando as mãos e as mergulhando nela, as ergam à boca,
Matem a sede da vida.
Quem me dera ser a água desta levada que lava,
Branqueia a roupa da existência das pessoas de tantas terras.
Por estas levadas passaram muitos segredos, – de miséria e desabafos de fortuna, – que a água, sempre a correr, foi levando para o mar. E é para homenagear esse rumorejo da água brando por vezes, zangado por outras, a caminho do mar, durante séculos, que versejámos, inspirados nas Fontes do grande poeta Afonso Lopes Vieira:
Três bicas deitando, / chorando, / cantando, / correndo / por entre canaviais; / Moinhos gemendo, / moendo aos ais…/ Bocas refrescando, / cântaros enchendo, / bulhando, / lavando, / regando vinhas e quintais…/ Chorando, / correndo, / falando, / de fome tremendo, / o mar estremecendo, / a maresia sabendo…/ Ouvi num brando falar: / um par a namorar…/ as coisas lembrando / que não voltam mais…/