Oriundo de Coimbra, o projeto “Estaca Zero” pretende revitalizar a música e instrumentos tradicionais como o guitarrinho, um cordofone nascido no século XIX, frequentemente utilizado em tunas rurais e urbanas. O octeto instrumental lançou, a 14 de março, o seu álbum de estreia, intitulado “As Aventuras do Guitarrinho no País das Possibilidades”, com o objetivo de dar uma nova voz ao instrumento que estaria esquecido e caído em desuso.
“Este álbum partiu da nossa vontade de criar repertório para este cordofone. Queremos que ele tenha, além de um passado, um futuro também. Nesse sentido, trouxemo-lo para a fila da frente e criámos temas onde ele é a figura de proa”, conta José Rebola, elemento dos “Estaca Zero”, em declarações ao “O Despertar”.
O grupo, formado em 2023, é composto por membros de diversos projetos musicais, nomeadamente: José Rebola (Anaquim), Pedro Damasceno (Diabo a Sete), Daniel Chichorro (Almedina Ensemble), Filipe Ferreira (Anaquim), Paulo Yoshida (Macadame), Ricardo Grácio (Brigada Victor Jara) , Diogo Miguel (Toeira Trupe) e Guilherme Canas Pinto (Madressilva).
Uma variedade de influências que, segundo José Rebola, contribui para enriquecer o álbum. “No meio da entropia que é ter oito pessoas a apresentar as suas ideias, acaba por resultar qualquer coisa que esperamos que espelhe as diferenças de sensibilidade dos elementos”, afirma.
“É um instrumento de pleno direito”
Após 1976, em Coimbra, foram localizados alguns exemplares de guitarrinhos em coleções particulares. O construtor Adérito Marques utilizou a sua oficina em Cantanhede para fazer algumas das primeiras réplicas conhecidas, em colaboração com José Machado Lopes. Nos últimos anos, o instrumento foi introduzido em vários grupos de folclore da região de Coimbra e, agora, chega a um novo projeto que pretende combater a sua extinção.
Nos “Estaca Zero”, é José Rebola quem dedilha o guitarrinho. “Tem um som muito melodioso e é apaixonante também pela sua portabilidade”, garante. Com o corpo parecido com a guitarra portuguesa, este cordofone destaca-se pelo seu tamanho reduzido. No entanto, de acordo com o músico, o seu tamanho não lhe reduz o potencial. “É um instrumento de pleno direito e com muito mais capacidades do que limitações”, sublinha.
Em “As Aventuras do Guitarrinho no País das Possibilidades”, há ainda espaço para outros instrumentos aos quais o grupo quer dar protagonismo, entre eles, a Viola Toeira, utilizada pelos estudantes da universidade para as serenatas que evoluíram até serem conhecidas como o Fado ou Canção de Coimbra.
O álbum apresenta, assim, uma fusão de geografias e linguagens que, tendo por base as tradições, ambiciona levá-las para novas direções. “Queremos respeitar a música tradicional portuguesa, mas partir dela para uma nova forma. Daí a escolha do nome ‘Estaca Zero’”, adianta José Rebola, acrescentando que “é importante passar a mensagem de que a música é um fenómeno global que chega às emoções de todos os humanos, sejam eles de que nacionalidade forem”.
Uma parceria que deu frutos
Desde a sua génese, o octeto musical tem contado com o contributo da Associação Cultural Museu da Música de Coimbra, que editou o disco através do seu selo MusMusCbr. Este tem como propósito “oferecer à cidade um equipamento cultural que visa a reunião, preservação e divulgação de elementos patrimoniais materiais e imateriais relacionados com a história da música de Coimbra, do país e do mundo”.
José Rebola recorda que a instituição tem estudado o guitarrinho e, inclusive, foi ela quem o desafiou a tocar o instrumento, dando também o impulso que faltava para os “Estaca Zero” acontecerem. As primeiras composições para o álbum de estreia surgiram há cerca de quatro anos e, em março, transformaram-se em construções sólidas.
“Muitos pormenores tiveram de ser trabalhados. Houve muita preocupação com o equilíbrio dos vários instrumentos, portanto, o álbum deu bastante trabalho. Contudo, ouvi-lo agora é um gosto e penso que está um belo álbum do qual nos orgulhamos muito”, frisa o elemento.
O single de apresentação é o tema “Música PraPular”, onde os músicos saltam de instrumento para instrumento, criando uma dinâmica única que promete cativar o público. “É muito engraçado ver essa riqueza a desenrolar-se em palco em que um elemento, ora está a tocar flauta, ora está a tocar concertina ou cavaquinho. Toda a paisagem vai mudando de música para música e é isso que nós queremos: essa diversidade e interesse contínuo no nosso espetáculo”, salienta José Rebola.
O músico confessa não criar expectativas em relação à recetividade deste primeiro disco dos “Estaca Zero”, no entanto, garante estar orgulhoso com o resultado final. “Estivemos realmente preocupados em fazer um trabalho que nos motivasse e desse vontade de levar a palco. Agora, esperamos ter, do lado do público, a recetividade e interesse que nós próprios temos neste álbum”, assume.
“As Aventuras do Guitarrinho no País das Possibilidades” chegou ao público no mês de março e José Rebola não tem dúvidas: este é um disco onde se sente e transmite a paixão dos seus oito membros pela música. “Todos têm, realmente, muita vontade de tocar, de subir a palco com este projeto e sempre com um sorriso”, conclui.