Coimbra, denominada por Vergílio Correia como a “cidade das grades”, tem em Lourenço Chaves de Almeida (1876-1952) um dos exponentes máximos da mestria no ferro forjado, estando a sua obra patente não apenas em contexto conimbricense mas também noutras localidades do país e além-fronteiras.
Nascido em Lamego, numa família com tradição nas artes aplicadas ou decorativas, trabalha, a partir dos doze anos, na oficina de serralharia do seu pai, António de Almeida, estabelecido na Régua desde 1881. No entanto, envereda, a partir de 1896, pela carreira militar, tendo pedido transferência para Coimbra, cidade na qual trabalha e reside durante a maior parte da sua vida. Na urbe mondeguina experienciava-se, à época, uma aura de estímulos cívicos e culturais, desenvolvidos pela Escola Livre das Artes do Desenho, no que à valorização e desenvolvimento de atividades artesanais e artísticas dizia respeito, com realce para o ferro forjado. Neste contexto, Lourenço Chaves de Almeida concilia a atividade criativa com a vida militar, trabalhando na oficina do Regimento em Sant’Ana e, desde 1929, em estabelecimento próprio, no Tovim de Baixo, exercendo, igualmente, as funções de Mestre das Oficinas de Serralharia e Mecânica na Escola Industrial Brotero (1914- 1916). Todavia, entre 1917-1918, integra o Corpo Expedicionário Português (CEP), seguindo para França no âmbito da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Apesar de participar na frente de combate, não se desvincula das artes férreas forjadas, utilizando, por exemplo, invólucros de munições para moldar peças que, pela sua perícia artística, eram muito apreciadas por camaradas de armas e superiores hierárquicos militares, assim como pelos habitantes de La Fosse, localidade situada na margem esquerda da ponte do rio La Lys, para onde a sua coluna retirou por forma a evitar a exposição às granadas inimigas, assinando os trabalhos que produzia e permaneciam em solo francês como “Almeida de Coimbra – Portugal”.
Regressado a Portugal, fica, em 1929, dispensado de responsabilidades militares, passando à reforma como 1º Sargento, tendo desenvolvido nas décadas de 1920, 1930 e 1940, obras de produtividade criativa relevante, desempenho de funções cívicas e pedagógicas, assim como a dedicação à investigação histórica e biográfica, nomeadamente: (1) o Lectus Romano, de estilo pompeiano, para Genoveva de Lima Mayer Ulrich; (2) o Relicário, encomendado por Afonso Lopes Vieira, designado a guardar uma madeixa dos cabelos de Inês de Castro, tendo o poeta designado Lourenço Chaves de Almeida como o “trovador do ferro”; (3) o Lampadário ou “Chama da Pátria” para o túmulo do Soldado Desconhecido, na Casa do Capítulo do Mosteiro da Batalha; (4) o Lustre Monumental da Câmara Municipal de Coimbra; (5) vários gradeamentos, portões e outras aplicações, em ferro forjado, para a casa de Bissaya Barreto em Coimbra; (6) Professor de Desenho na Penitenciária; (7) Tesoureiro do Conselho de Arte e Arqueologia; (8) Auxiliar do Diretor do Museu de Machado de Castro; (9) estudo dedicado a João de Ruão, no qual advoga que o escultor terá chegado a Coimbra em 1518, antecipando em vários anos a cronologia defendida por variados autores; (10) o trabalho de pesquisa consagrado aos Túmulos de Alcobaça, mediante o qual defende a tese inovadora de que os sepulcros de D. Pedro I e D. Inês de Castro são obra da escola escultórica conimbricense e não de artistas franceses, ao contrário do que indicavam especialistas reputados; (11) biografia de Heitor Vaz Pinto de Athayde Pimentel da Mesquita e Vasconcelos (1818-1898), natural da Régua, também conhecido por Santo Heitorzinho do Loureiro, com quem conviveu.
A publicação das Memórias de um Ferreiro, da autoria de Lourenço Chaves de Almeida, pela Imprensa da Universidade de Coimbra, em 2007, contribui para um melhor entendimento deste mestre do ferro forjado como um homem particularmente sensível na sua abordagem criativa, demonstrando uma curiosidade intelectual dotada de uma apurada capacidade de observação e respeito pelos testemunhos históricos. Afonso Lourenço Chaves de Almeida, seu neto e impulsionador da publicação em apreço, faz votos de que “estas Memórias possam vir a suscitar o interesse na procura de documentos de outros artistas…, tantos e tão variados foram eles nas artes e ofícios dessa época… e, assim, possamos dar a Coimbra o que lhe pertence de facto e impedir que, por incúria de alguns, todos o percam definitivamente”. Que esta expectativa se concretize.