O Primeiro-ministro bem queria dar por encerrado o escândalo da nomeação do português José Guerra para a Procuradoria Europeia, que tanto embaraço lhe tem causado nas últimas semanas. Mas, infelizmente para o Governo socialista, agora são as instâncias europeias que exigem explicações “imediatas” para as “notícias alarmantes”.
Tentando pôr água na fervura, António Costa garantira (em apoio da versão da ministra da Justiça, Francisca Van Dunem) que os “meros lapsos” no currículo de José Guerra tinham sido “irrelevantes” no processo de escolha do procurador europeu e que na UE ninguém estava preocupado com assunto. Porém, soube-se recentemente que o caso está longe do seu fim.
Um documento do Conselho da União Europeia, de 7 de outubro do ano passado, ao qual a RTP teve acesso, demonstra que a decisão de nomear José Guerra para procurador europeu foi de facto fundamentada na carta com “lapsos” enviada pelo Ministério da Justiça e que o Conselho Europeu se baseou em dois dos três pontos curriculares errados para justificar a escolha de Guerra: ter sido Procurador-Geral Adjunto, a categoria mais alta o Ministério Público (cargo que ele nunca exerceu) e ter dirigido a 9.ª secção do DIAP, identificado como o maior departamento nacional de combate ao crime económico-financeiro (quando, na verdade, é o DCIAP, onde José Guerra nunca trabalhou, que investiga os casos mais complexos desse tipo de criminalidade).
Agora, para vergonha de Portugal várias instâncias comunitárias declaram-se chocadas com os métodos usados pelo Ministério da Justiça português. Depois de a maior bancada do Parlamento Europeu, ter exortado a presidente da Comissão Europeia a intervir no caso, também os liberais no Parlamento Europeu, o terceiro maior grupo do hemiciclo comunitário, se afirmaram, na semana passada, “preocupados” com a nomeação do procurador José Guerra e exigiam clarificações.
O grupo parlamentar europeu “Renovar a Europa” (antiga Aliança dos Liberais) escreveu ao presidente cessante do Conselho Europeu e ao Primeiro-ministro português, António Costa (que no primeiro semestre deste ano preside ao Conselho), exigindo “clarificações públicas imediatas” sobre o processo, advertindo que admite solicitar um debate no hemiciclo ou mesmo um inquérito independente sobre estas “notícias alarmantes”.
Na missiva, com a data de 10 de janeiro, o líder da bancada, Dacian Ciolos, e a eurodeputada Sophie in´t Veld, coordenadora na comissão parlamentar de Liberdades Civis do PE, começam por salientar que não questionam as qualificações do magistrado José Guerra, mas dizem-se “muito preocupados com o processo de nomeação”, que sustentam, pode ter-se baseado em informações falsas e motivações políticas.
“O Conselho Europeu não seguiu a recomendação de um painel de seleção independente, designando antes (um candidato) classificado mais abaixo na lista. No caso do nomeado português, a decisão foi tomada após o Governo português ter enviado informação adicional. Contudo, a informação adicional providenciada revelou-se falsa”, apontam os liberais na sua carta.
Entretanto, em Portugal, os delegados à assembleia do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público criticaram o processo de nomeação do procurador José Guerra, salientando que as nomeações “com base em critérios de natureza política podem comprometer a independência da investigação”.
A ministra da Justiça enviou já ao representante português junto da União Europeia uma correção aos erros que constam do currículo do procurador Guerra e insiste em que tem todas as condições para continuar no cargo, mas de todos os quadrantes continua a ouvir-se exortações à sua demissão.