António Augusto Gonçalves (1848 – 1932) é uma personalidade incontornável na memória coletiva conimbricense. Filho de António José Gonçalves Neves, pintor e decorador de reconhecidas aptidões artísticas, não completa o curso de Farmácia na Universidade de Coimbra. No entanto, manifesta conhecimento e domínio de múltiplas disciplinas com predicados artísticos: pintura, desenho, cerâmica, gravação, serralharia ou escultura, nas quais se destaca o talento para o traço de cunho histórico. A sua matriz política de influência republicana é representativa de um apostolado ideológico caracterizado por iniciativas de participação cívica, das quais se destacam: (1) Jornalista em periódicos vários, assinando em nome próprio ou recorrendo a pseudónimos, refletindo tanto acerca de temáticas alusivas às artes, pedagogia artística, arqueologia, museologia conimbricense como manifestando opiniões críticas relativas ao panorama político nacional e regional; (2) Vereador (1887/1889) e presidente da Câmara Municipal de Coimbra (1911/1913); (3) Fundador da Escola Livre das Artes do Desenho (1878), do Museu Municipal de Artes e Indústrias (1889) assim como do Museu Nacional de Machado de Castro (1911), tendo sido, igualmente, seu diretor entre 1913/1928; (4) Coordenação artística e arqueológica do restauro da Sé Velha, iniciado em 1893; (5) Participa, no final do século XIX e início da centúria subsequente, em escavações arqueológicas decorridas em Conimbriga e Montemor-o-Velho; (6) Desempenha a atividade de professor em coletividades de cariz operário, tais como a Associação dos Artistas de Coimbra ou a Escola Livre das Artes do Desenho, a partir de 1868 e 1878, respetivamente. De igual modo, inicia em 1885, a docência na Escola Industrial Brotero, tendo, em contexto superior, lecionado, na Universidade de Coimbra, a cadeira de Desenho nas Faculdades de Filosofia (1898/1911) e Ciências (1911/1928).
A informação supramencionada legitima a herança humana, social, cultural, artística e pedagógica de António Augusto Gonçalves, percecionando-a como uma manifestação da importância do livre-arbítrio. Através de uma abordagem resiliente e rebelde, valorizou a educação artística do operariado e a salvaguarda dos bens patrimoniais, por si entendidos como um reflexo idiossincrático das sociedades.
Nas palavras de Belisário Pimenta, “António Augusto Gonçalves foi realmente alguém”, não obstante o Mestre, nos últimos anos de vida, ter manifestado frustrações pessoais, entendendo que “desperdicei a vida a pensar em utopias e inépcias”. Discordo. A passagem do tempo histórico permite interpretar acontecimentos passados com clareza e espírito crítico isento. Durante algum tempo, António Augusto Gonçalves transformou a utopia em realidade. O que era quimérico deixou de o ser. Contribuiu para valorizar, imparcialmente, o mérito e o talento. E deixou, vincada, a mensagem de que tentar e não desistir é sinónimo de Liberdade e Humanismo.