20 de Junho de 2025 | Coimbra
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António Inácio Nogueira

TESTEMUNHOS: VIAGENS V

20 de Outubro 2023

Moinhos de Vento: a Mística Melodiosa no Bucolismo do Oeste

Sonhei esta noite com os belos «moinhos dos púcaros», – como eu os apelidava.  Fiquei a conhecê-los nas viagens que fazia no Verão, com a minha família, à zona do Oeste. Eram moinhos de vento, mais propriamente, “moinhos de vento vertical” ou “nora das nuvens”, esta última designação, muito utilizada por um poeta árabe.

De arquitectura simples, sóbria, mas elegante, alguns bem preservados, outros nem tanto, tinham o condão de me fascinar pela mística melodiosa que o vento ao entrar nos púcaros produziam, tornando aquele bucolismo do Oeste fascinante. A sua torre fixa de alvenaria, a introdução da vela latina no mastro do moinho – que se deve ter efectuado no final século XVII – transubstanciou aqueles moinhos de vento numas máquinas extremamente eficientes quanto ao aproveitamento da energia potencial do vento.

Importa dizer que a técnica de moagem aportou à Europa por duas vias: uma, através da Rússia, para os países do Norte, da Escandinávia e do centro europeu; outra, provavelmente ligada à expansão muçulmana e às cruzadas, pelas margens do Mediterrâneo para a Europa do Sul, Portugal e Espanha incluídos.

Todavia, o primeiro documento a referir expressamente um moinho de vento é de 1182 e indica um equipamento doado ao Mosteiro de S. Vicente de Fora. Em 1262 um documento do tombo de Alcobaça refere a existência de um outro moinho de vento, no termo de Óbidos, propriedade do Mosteiro do mesmo nome.

Os moinhos de vento, em Portugal, tradicionalmente usados na farinação do trigo, estarão quase exclusivamente ocupados na moagem de milho a partir do momento em que este passou a ser o cereal mais cultivado no país.

Como é sabido toda a costa portuguesa é varrida, praticamente durante todo o ano, por vento suficiente para possibilitar a instalação de moinhos de vento de Norte a Sul do país.

Segundo Borges de Macedo, a região envolvente da cidade de Lisboa e todo o litoral oeste do País, assiste, no século XVIII, à proliferação deste tipo de moinhos, particularmente depois do terramoto de 1755.

O século seguinte será dominado por esta técnica de moagem que subsistirá até meados do século XX. No Oeste, o abandono desta técnica foi bastante mais vagaroso e ela perdurará até à década de 50 do século XX. Especialmente as unidades moageiras ligadas ao abastecimento das pequenas comunidades rurais conseguiram resistir por largo tempo à concorrência industrial. Foram  esses sobreviventes que tive o privilégio de bem conhecer.

Nos Inquéritos Industriais de 1890 referentes aos concelhos do Oeste, que eu visitava, a norte de Lisboa, era grande a importância da actividade moageira dos moinhos de vento que seriam no total cerca de 498 .Por exemplo, Caldas da Rainha (94 moagens), Óbidos (90), Torres Vedras (84) e Lourinhã (71). Actualmente 90 por cento destes estão ao abandono.

Mas afinal, e para terminar, o que é o moinho de vento que me deliciava e que tão harmoniosa tornava a paisagem do Oeste?

Nas palavras de Orlando Ribeiro: “O moinho [de vento] é constituído por um corpo cónico de alvenaria, com telhado giratório, donde sai o eixo que suporta quatro pares de vergas perpendiculares, ligadas por cordas na extremidade; coloca-se em cada sector uma vela triangular. Às cordas atam-se púcaros, onde o ar assobia graças ao movimento giratório; os moinhos fazem assim ouvir através dos campos solitários uma toada lamentosa.” [ a devida vénia ao artigo de A. Santos de 2015].


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