O acto de escrever é, quase sempre, intrincado: que comunicar?; que realçar?; que impressões ecoar?; que silêncios guardar?
No caso de um pequeno artigo, teremos sempre que aligeirar o texto. É quase impossível escrever sobre tudo que se viu, ouviu, reflectiu. Sendo assim, pedimos desculpa a quem concebeu este Projecto de que vou falar, pelas faltas ou esquecimentos involuntários que possa cometer. De qualquer maneira, resolvi soltá-lo aqui, porque merece.
Desde há muitos anos que tinha interesse em conhecer a vila de Santar. Pelo que me faziam chegar, valia a pena uma visita a esta fidalga terra. Desta vez não resisti à minha grande curiosidade, e lá fui de abalada até esta chão beirão. Não me arrependi e aconselho todos os que lerem este artigo a tomarem a mesma iniciativa. Não se vão decepcionar.
Santar, situada no concelho de Nelas, é um lugar que nos surpreende pelo seu rico e aparatoso património, onde os solares abundam, e, a beleza da sua paisagem, é também, memorial invejável. O granito releva os espaços e transforma-se numa prodigalidade de muros, fontes, tanques e edifícios aristocratas. Outras vertentes, agrícolas, rústicas e religiosas, persistem esteticamente juntas. Enfim, o património material e imaterial é deveras rico e digno de se ver.
Tudo isto basta para prevalecer como uma terra de luminosidade ardente, beleza inconfundível, onde os seus quase 2000 habitantes «eco-habitam» ameigados por várias instituições, algumas seculares, de música, apoio social, cultural, recreativo.
Por detrás desses seus rústicos muros, espreitam e moram belos “jardins armados em terraços” e um sem fim de sebes, em bucho. No seu interior lá meandram tanques, fontes, onde a água corre e se enleva, transmitindo em seu redor um torvelinhar que é quase um silêncio único. As roseiras,vinhas e a outra variada flora, dão à panorâmica um simulacro quase de Olimpo.
As inúmeras «pérgulas» de arquitectura variada ( algumas de arquitectura mais arrojada e menos tradicional), com os seus bancos de pedra ou madeira, encimadas e folheadas por verdejantes trepadeiras, formando coberturas amalgamadas por flores e roseiras intensas, proporcionam aos seus jardins espaços de observação e escuta a quem os visita ou habita. É o tal silêncio que não é mudez, o tal que «bule» a alma.
Com base neste contexto de enorme virtude e beleza, o arquitecto Fernando Caruncho e seus auxiliares, vêm desenvolvendo um projecto paisagístico, holístico e integrador, por isso o apelidam de Santar a Cidade Jardim.
Foi desta forma que conseguiram enlaçar como um todo o Jardim Conde de Santar e Magalhães, Jardim Magnólia ( onde pude contemplar uma imponente magnólia, cameleiras, rosas de coloração embriagante), Jardim Linhares Santar e Magalhães ( onde sobressaem laranjeiras, cosmos, papoilas da Califórnia, e uma majestosa «pérgula»), Jardim Linhares Ibérico Nogueira ( onde se contemplam pomares, hortas, plantas aromáticas, lugares confinados por videiras, lugares de prática da cultura biológica e comunitária).
Observei tudo isto durante uma visita guiada organizada pelo Projecto, acompanhado por uma guia competente (a Ana), que se veio a revelar pelo discurso fluente e sábio, que ajudou a compreender a envolvência intima das famílias, a pertença destes locais divinos, agora unidos nessa parceria paisagística.
Enfim, explorei as belezas dos jardins históricos, vinhas, património edificado. Caminhei por dentro desta beleza sem fim. Fiquei cansado das pernas, mas com a alma rejubilante.
Para terminar, uma surpresa. Fiquei a saber da produção de óptimos vinhos. Comprei uma garrafa de vinho branco, com a marca Memórias. Nada mais apropriado ao lugar.
Depois disse adeus a esta beleza infinda. Até sempre Santar!…