Vivemos numa sociedade instante, vertiginosa e ansiosa. As pessoas tem uma mente esvoaçada e stressada. Resignação e tolerância para as contrariedades estão a tornar-se artigos de opulência. Atravessamos a era da indústria do entretenimento e, paradoxalmente, existe-se na era do aborrecimento.
Tudo isto é dito por vários especialista da coisa.
No entanto, a depressão, a ansiedade e o stresse não são novos, nem sequer específicos destes tempos. Pergunte-se aos ainda vivos combatentes da Guerra Colonial se não pressentiram todos eles, lá nos confins onde o silêncio doía.
A ansiedade é um clamor permanente que cava no corpo de um soldado. Eu conheci esse sentimento despropositado que dói por dentro, vai à mais profunda das entranhas. Senti , por vezes, tudo isso na guerra, principalmente, na Guiné.
Quando saía do arame farpado do quartel e caminhava fora, o meu coração saltava frenético. Era uma confusão entre medo, ansiedade, falta de vontade em caminhar. Sabia que o inimigo estava próximo. Apertava a minha arma contra o peito, e à medida que avançava sem contacto com o inimigo, quebrava-se o medo. A ansiedade adormecia. A exuberância e a vontade de retornar à vida, em pleno, tornava.
Cumprida a missão, restava o regresso. Voltava a ansiedade da morte, do encontro inesperado, sempre indesejado. Suava de medo, atormentado pela interrupção da tornada. A família vinha ao encontro de mim para me ajudar a chegar.
Silêncio… estava quase no arame farpado salvador, protector…
Entrei. Qual depressão, qual quê, para quê?!…
Quando chegava a noite tudo era igual, à espera do amanhã sempre incerto. Por isso, se desabotoava a alma e se escrevia:
Meu amor vou partir, a guerra espera, vou-te deixar,
Já sinto a balada triste do meu pensar,
Já vejo o sofrimento de não voltar.
Estou vazio, dá-me vontade de chorar;
Também magoado estou, a indignar.
O coração, já sem força, bate devagar,
Ansioso está, p’ra deixar o tempo passar.
Ouve-me, um pouco, meu já desfeito coração,
PÁRA um instante, não quero sentir a percepção da morte,
Já que a morte não é superação.
É noite alta, nas alturas do avião da guerra, vai nascer o dia.
Meus pensamentos deslizam vagarosos como secos rios;
Está sobre mim um véu de sombra e melancolia.
Estou moribundo e tenho os lábios frios,
Não alcanço novo dia que sorria.
Ó, o do soldado é negro, já o pressentia.
Estendo os braços mas logo caem;
Não ouço a tua voz para além dos tiros,
Não acolho teus mimos no seio do capim;
Vejo então a longa distância donde saem
Os ecos das saudades que sentimos.
Depois do verbo e do verso, ecoou o canhão; estilhaços caíram em redor, a depressão voltou, a ansiedade veio bater-me, encarniçadamente, no peito.