20 de Junho de 2025 | Coimbra
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António Inácio Nogueira

TESTEMUNHOS: Milhões e Tostões

9 de Junho 2023

Todos os meses um grupo de amigos que primos são, reúnem~se em redor de uma mesa, onde abunda a boa comida, bebida e a conversa adequada às circunstâncias.

Apelidam os participantes neste convívio, quase fraterno, de Almoço dos Primos.

Calha a preceito que alguns dos primos têm o dom, apelidado pela sabedoria do povo, de «ter piada e saber fazer rir», o que faz reinar a boa disposição e o sorriso da comunicação aberta. Outros possuem outras valências vivênciais, pelo que este mosaico tão rico de valores, tornam as reuniões de sabores e saberes bem agradáveis.

No entanto, não pensem os meus leitores que sempre assim decorre a reunião dos primos, pois assuntos mais sérios são acolhidos e discutidos, muitas vezes, até ao caloroso diálogo.

Foi num desses dias, esse dedicado à Banca, que o primo Armando recordou uma história passada ao balcão de um banco da Lousã, onde iniciou carreira em 1969.

Assim contou o Armando.

Certo dia, estando eu de serviço ao balcão, abeirou-se de mim um homem de idade, com aspecto humilde e educação esmerada, e perguntou”: « Os senhores põem dinheiro a prazo? Por quanto tempo, por exemplo, a seis meses?» O Armando correspondendo à interrogativa com amabilidade, respondeu afirmativamente à questão apresentada pelo ancião e ainda alvitrou outras alternativas.

Perante as respostas e explicações ouvidas, o velho e sábio aforrista, chegou-se mais ao balcão e num discurso manso, para que ninguém ouvisse perguntou: «Mas afinal qual é o juro a 6 meses?».

O Armando balbuciou também baixinho, imitando o interlocutor, o número respeitante ao juro respectivo, correspondendo ao segredo do velho. Este, depois de pensar para «com os seus botões», e chegando-se ainda mais ao balcão interroga: «E se for uma quantia muito boa, pode ser maior?». Respondeu o Armando: “possivelmente, mas tenho de falar com o gerente do banco”. O velho, então já com outras expectativas, e ainda mais chegado ao Armando, quase orelha a orelha, balbuciou, quase inaudível e ufano: «Pois é, tenho aqui três contos…»

O Armando teve um engulho na garganta, quase lhe vieram as lágrimas aos olhos… logo após, pensou para consigo – seria possível que uma longa e penosa vida de trabalho se resumisse àquele magro quantitativo, tão escondidamente no bolso, de umas calças meias coçadas, pelo tempo e pela vida dura de um velho?

Era mesmo possível!

E eu concluo, se posso e tenho subtileza para tal: ontem tostões eram já contentamento; hoje milhões, são esbanjados neste mundo de consumismo, divinizado, em que pouco se amealha, tudo se desbarata e onde até os deserdados se embrenham e perdem.

Fruto dos tempos e dos homens.

Obrigado primos Abel e Eugénia, Reinaldo e Mafalda, Armando e Milú, Carlos e Hélia, Geninha, por me proporcionarem tantas histórias e aprendizagens. Disse.


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