Rafael Ramos, residente na Lousã, nasceu sem pernas e sem um braço. Uma infância “dura” e uma vida de “superação”. Atualmente, com 30 anos, continua a ser uma inspiração e é a prova de que apesar dos obstáculos é possível realizar os sonhos, como ser pai. Um jovem que ama a vida e não é por acaso que o lema que o acompanha é “sorri para a vida, para a vida sorrir para ti”.
Nasceu sem pernas e apenas com um braço. Aprendeu a viver com metade do corpo. Mas apesar desta condição, Rafael Ramos desafia diariamente todas as suas adversidades. “Viver” e “superar” são os seus nomes do meio.
Desde muito cedo que se apercebeu da sua deficiência. “Sempre fui uma criança aventureira e tentava explorar tudo ao máximo e notava que era diferente”, começou por contar.
Na altura, conta, “foi um choque para os meus pais, sobretudo para a minha mãe, pois não imaginava que ia nascer assim, uma vez que os médicos nunca revelaram que algo estava mal nas ecografias”. “Foi um processo complicado para a minha família de lidar inicialmente com a minha deficiência”, recordou.
Uma infância “dura” passada até aos cerca de 10 anos numa aldeia, em Dornelas do Zêzere, do concelho da Pampilhosa da Serra, onde concluiu o primeiro ciclo de escolaridade. “Na creche, por exemplo, as outras crianças viam-me de maneira diferente e tive momentos que me senti muito sozinho, porque os meninos não brincavam comigo”, desabafou.
Ainda assim, arranjou motivação junto das outras crianças para poder sentir-se integrado, como a vontade de jogar à bola com os colegas da escola. “Tinha uns cinco anos e quis jogar futebol e foi aí que perceberam que se calhar eu também conseguia fazer o mesmo que eles”, partilhou.
Mas a verdade é que foi assim durante toda a sua vida, a superar-se dia após dia. Rafael Ramos veio viver para a Lousã muito novo, onde completou o segundo ciclo do ensino básico. Afastado da família e dos amigos da sua aldeia, foi alcançando os seus objetivos, “com muito foco, fé e esperança”.
“Quando vim viver para a Lousã fui para uma instituição, a ARCIL, que apoia pessoas portadoras de deficiência e, desde aí, foi todo um novo processo de adaptação”, relatou ao desabafar que sofreu de discriminação e ‘bullying ‘psicológico.
“Tentei suicidar-me”
Rafael Ramos, aos 15 anos, passou “pela fase mais negra” da sua vida. “Tentei o suicídio na antiga linha de comboio, na Lousã, pois sentia-me emocionalmente muito abalado, mas tive a sorte de um amigo da instituição me impedir de o fazer”, contou.
Foi a partir desse momento que, afirma, “decidi que tinha de mudar a visão da minha vida e provar a mim próprio e à sociedade que mesmo tendo uma deficiência era capaz”. “Na instituição fazia as tarefas domésticas”, acrescentou.
Mas não se ficou por aí. Rafael Ramos é mesmo um exemplo de superação. Ir ao ginásio, jogar futebol, andar de skate e até fazer surf são algumas das atividades que já realizou. “Fui sempre mostrando que era capaz e é essa a mensagem que quero transmitir”, salientou.
Uma mensagem que passa através das palestras motivacionais, onde partilha a sua história para provar “que, independentemente das nossas dificuldades, tudo é possível. Basta acreditar”.
Com 21 anos saiu da instituição e foi viver com a sua companheira, Sandra Barreira, com quem realizou um dos maiores sonhos: ser pai. “Aos 28 anos fui pai do Henrique, que completa três anos em abril”, disse em tom de felicidade.
Rafael Ramos assume ter “uma excelente relação” com o filho, repleta de amor. “O Henrique sabe que o pai é diferente, mas é algo que não o afeta. Eu brinco com o meu filho normalmente” partilhou.
Rafael Ramos quer ser um exemplo de orgulho e superação para o seu filho Henrique
O processo de integração
No mundo do trabalho, revelou, “sempre se integrou e adaptou bem”. Começou a trabalhar aos 19 anos e, desde aí, abraçou várias experiências e neste momento trabalha no setor de Desporto e Juventude no Museu Municipal Professor Álvaro Viana de Lemos, na Lousã.
“A nível profissional até ao momento foi um bom percurso”, frisou.
A residir na Lousã, Rafael Ramos falou das acessibilidades. “Esta questão vai além da acessibilidade urbana, contempla o trabalho, a educação, a integração, a vida social, entre muitos outros aspetos, mas a nível de acesso aos locais e serviços a Lousã é 94% acessível”, explicou, afirmando que “consigo fazer a minha vida de forma independente, pois é uma vila que está preparada para pessoas com deficiência terem qualidade de vida”.
Desde ir a uma casa de banho pública, às finanças, à igreja ou ao multibanco, “não há dificuldade”. “Se for a outros concelhos sinto que não há tanta acessibilidade como aqui”, salientou.
O livro “Rafael – Fé, Amor e Esperança” foi lançado em 2018. Da autoria de Rui Miguel Saraiva, a obra mostra como Rafael Ramos encara as adversidades com resiliência e coragem, mostrando que as limitações físicas podem ser um obstáculo, mas não impedem a realização pessoal.