29 de Abril de 2025 | Coimbra
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António Inácio Nogueira

Questionamentos e Imaginários Que a Mente Urde

11 de Abril 2025

Gosto dos artigos de Pedro Mexia, aos sábados, no Jornal Expresso.

Num dos últimos, com o título, Sem Prémio Nem Castigo, a certa altura leio: “ (…) a questão conhecida como “teodiceia” diz respeito à pergunta “como é que Deus permite que o mal exista?” Continua o texto: “Quando se trata de um comportamento humano, a resposta costuma ser: por causa do livre – arbítrio. As pessoas fazem o que escolhem fazer, e Deus não as pode impedir, uma vez que lhes concedeu liberdade. Mas e os terramotos ou os vulcões, as tragédias provocadas pela natureza? A explicação de que Deus também não interfere nas leis naturais deixa a desejar, porque se o livre – arbítrio dos homens pode ser uma instância do mal, um vulcão, ou uma placa tectónica não fazem nada “por mal.”

A minha perplexidade, continua Pedro Mexia a escrever, que não sei se é teológica, talvez não impressione tanto, mas inquieta-me (….) terei eu sido recompensado pelo bem que fiz e castigado pelo mal? Às vezes sim, outras vezes não, não há regra. Na verdade, o meu mérito e demérito, valor e desvalor, não tiveram, ao longo das décadas, qualquer ligação necessária ao que me aconteceu. Ao esforço de sermos bons e à fraqueza de sermos maus segue-se o ocaso, a injustiça, a aleatoriedade ou o absurdo. Camões chamou a esse desajuste “o desconcerto do mundo”. Mas isso é já acreditar que o mundo, de seu natural, está concertado.

Pergunto-me eu agora: E as guerras onde morrem milhões de pessoas em condições de sobrevivência precária? Como se ajustam a este texto magnifico do Pedro?

O meu tio que esteve na Primeira Guerra Mundial e sofreu os horrores daquela carnificina – disse um dia: Cristo não nos ajudou.

Em 1916, Portugal entrou na Primeira Guerra Mundial. Sob extremas e fracas condições nas trincheiras, os soldados portugueses, que começavam a sofrer enormes perdas de vidas, encontraram numa intersecção de estradas, entre as localidades de Lacouture e Neuve-Chapelle, um cruzeiro com uma estátua de Cristo, tornando-se o monumento num objecto de veneração e devoção, alvo de preces e pedidos de protecção. As forças portuguesas no dia 9 de Abril de 1918, dia sofreram uma derrota estrondosa ao serem surpreendidos pela Ofensiva da Primavera, na Batalha de La Lys, estimando-se que cerca de mil soldados portugueses faleceram, outros mil estavam então em paradeiro desconhecido, quatro mil feridos e mais de seis mil feitos prisioneiros.

Durante a violenta batalha, a imagem do Cristo, que havia perdido uma das mãos, parte das pernas, ambos os pés e no peito tinha sido atravessada por uma bala, foi encontrada de pé quando todo o seu envolvente estava em ruínas. Sob o fogo da artilharia alemã, a estátua foi então resgatada por alguns militares portugueses que, pela sua fé, decidiram trazê-la consigo, através da lama e dos perigos da ofensiva, até encontrarem um local seguro, entre as ruínas da localidade mais próxima, no intuito de a proteger. Após o conflito, a história dos militares que salvaram a estátua do Cristo foi relatada em vários periódicos franceses e nacionais, passando a imagem a ser referida como Cristo das Trincheiras.

Anos mais tarde, durante a reconstrução do pós – guerra, a estátua foi colocada no cruzeiro onde originalmente se encontrava.

Cristo das Trincheiras no Mosteiro da Batalha

 

Em 1958, numa iniciativa de cooperação entre o governo português e o governo francês, assim como num gesto de homenagem às vítimas portuguesas da Primeira Guerra Mundial, o município de Neuve-Chapelle entregou a estátua do Cristo das Trincheiras a Portugal

Após uma breve romaria por vários pontos do país, a cruz e a imagem do Cristo de Neuve-Chapelle foram colocadas, durante uma cerimónia oficial, militar e religiosa, na Sala do Capítulo do Mosteiro da Batalha, olhando os dois Soldados Desconhecidos, cujos corpos foram trazidos, em 1921, de França e de África [ uma devida vénia à Wikipédia].

Actualmente, é um marco emblemático do Mosteiro da Batalha.

Cristo das Trincheiras

No Museu da Liga dos Combatentes, sito no Mosteiro da Batalha, encontrei esta pintura de Cristo nas Trincheiras.

No meio do nada, ergue-se sofrida a imagem de Cristo. O que nos quererá dizer ela? Poderá responder-nos ao porquê das novas trincheiras abertas na Ucrânia?

A mim, diz-me muito e coloca-me muitos, Questionamentos e Imaginários. Deixá-los-ei para a minha mente urdir.


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