O tão necessário como urgente anti-racismo, finalmente na ordem do dia devido aos últimos e gravíssimos acontecimentos nos EUA, está paradoxalmente a dar espaço a um fanatismo absolutamente irracional que resolveu esquecer as lições da História, pior resolveu ignorar a importância da História como testemunho de comportamentos condenáveis, assim fazendo esquecer aquilo que deveria ficar na memória da Humanidade, como lição, como exemplo a não seguir.
A destruição de estátuas de criminosos racistas e esclavagistas acaba por não apoiar a causa anti-racista, por um lado porque os vitimiza falsamente junto dos seus atuais apoiantes, por outro, devido à total ignorância dos fanáticos destruidores, que não sabendo identificar os comportamentos referentes a cada época, assim criminalizam figuras históricas notáveis que então se encontra, perfeitamente integradas em práticas hoje condenáveis ou pelo menos criticáveis.
Não me refiro, evidentemente, aos erros crassos desses fanáticos quando atacam figuras exemplares da nossa História, como foi o caso do padre António Vieira, ele próprio mestiço e protetor dos índios brasileiros contra a sua escravização pelos colonos brasileiros, demonstração cabal da ignorância ou estupidez pura e simples destas massas ignorantes.
E que dizer da diabolização de um Gandhi, de um Winston Churchill?! Alguns pecados – mesmo graves – apagam o seu papel luminoso na História da Humanidade, um como exemplo de pacifismo militante, o outro por ter salvado o mundo do monstro nazi?
Levando ao extremo estes comportamentos iconoclásticos, porque não destruir as estátuas dos faraós e dos reis do Egipto e da Mesopotâmia, dos governantes de Atenas e das cidades-estados da Grécia Clássica, dos filósofos e políticos gregos e romanos, quase todos eles racistas e utilizadores de escravos – não necessariamente negros – muitos dos santos das Igrejas cristãs, e não vale a pena ir mais longe, porque a dinamitação dos budas e de inúmeras estátuas de Palmira pelos taliban são um excelente aviso do terreno instável em que tais criaturas se situam.
O desconhecimento dos contextos históricos não pouparia grandes figuras da nossa História, a começar pelo Infante D. Henrique, que beneficiou do comércio de escravos africanos, dos nossos primeiros reis que escravizaram muitos dos muçulmanos vencidos na Reconquista cristã, em resposta, é bom lembrá-lo, à anterior ocupação islâmica da Península Ibérica, não propriamente meiga para com os cristãos…
Tenho como certo que esta apropriação de bandeiras equivocamente atribuída à extrema-direita não passa de uma provocação de neonazis e dos seus aliados do Chega, como forma de revoltar toda a população contra ao Esquerda, assim conotada com os imbecis que lhes estão a dar tempo de antena.
Encarando com objetividade esta quanto a mim falsa a questão, a fúria iconoclasta a que estamos assistir é demasiado parecida com a queima de milhares dos livros perpetrada pelos nazis no início da ditadura de Hitler, com antecedentes históricos tão “respeitáveis” como as várias destruições da Biblioteca de Alexandria por fanáticos cristãos e muçulmanos, em épocas diferentes mas com “argumentos” equivalentes.
Essas marcas materiais do inominável são fundamentais para que a Memória se mantenha viva e vigilante e a História não se repita, como começa a acontecer!