23 de Abril de 2025 | Coimbra
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“O Despertar” inicia nova fase

14 de Abril 2022

Por Lino Vinhal

A vida é feita de mudança e o mundo, ainda que por vezes regrida, só tem uma direcção: o futuro. “O Despertar” iniciou essa caminhada há 105 anos e tem mantido a passada, atravessando períodos que a história tem vindo a registar como difíceis: as perturbações do ano em que surgiu, 1917, com o advento do comunismo e os eventos conhecidos como aparições de Fátima. Estávamos então a chorar os mortos da primeira Grande Guerra e, ainda mal enxutos, vem o 28 de Maio de 1926 que, pouco ou nada virado para as democracias, desenha aí o fim da primeira República e abre as portas ao Estado Novo que a Constituição de 1933 viria a consagrar. Aqui ao lado, a Espanha envolve-se numa sangrenta guerra civil em 1936. A segunda grande guerra não demora a chegar e destruiu grande parte da Europa, capitalizando à sua conta mas de 60 milhões de mortos. A política de Salazar de rasoirar por baixo despertou em grande parte da juventude portuguesa a vontade, e a necessidade, de emigrar, primeiro para as Américas, depois para a Europa. A guerra colonial cortou a caminhada a muitos desses jovens, chamados a combater em África sem que muitos deles compreendessem porquê. Veio o 25 de Abril, prestes a fazer 50 anos, que trouxe as perturbações naturais a acontecimentos com este perfil mas trouxe também a liberdade, a democracia e renovou os ventos da esperança. Esperança e regime político que se mantêm 50 anos depois e que, apesar das “gripes” sazonais de que por vezes padecem, continuam de bem com o povo português que por este regime dá mostras evidentes de por aqui se querer manter.

Tudo isto “O Despertar” viveu e acompanhou ao longo destes 105 anos pela mão firme das várias gerações que lhe foram dando corpo e alma. Gerações diversas que mantiveram sempre com os leitores, colaboradores e assinantes, uma proximidade que fez deste projecto uma família editorial que, sendo velho, se renova a cada instante. “O Despertar” é uma família que, apesar de vasta e dispersa, se mantém unida pelo calor amigo e afectuoso que dela irradia, envolvendo alguns milhares de pessoas neste abraço colectivo que a todos saúda, semana após semana.

Nos últimos anos, 12 exactamente, o testemunho desta quase “aventura” de tantos anos tem vindo a ser empunhado por Zilda Monteiro, jornalista de profissão e muito mérito, que bem se integrou neste espaço editorial Media Centro, convivendo de braço dado com o Campeão das Províncias e outros meios que constituem uma estrutura comum. Foi este o desenho saído da última conversa que tive com Fausto Correia, à altura Director de “O Despertar”, menos de duas semanas antes da sua abrupta e inesperada morte. E revelo-o agora, decorridos estes anos todos. Lá em cima, no Hotel D. Luís, jantávamos os dois em deleite pela vista magnífica que nos oferece Coimbra, olhada por fora mas sentida por dentro. Se algo me acontecer – dizia-me o Fausto — tu não deixas morrer “O Despertar”. Integra-lo na tua estrutura. Encontra uma solução, mas não deixes que o Jornal morra comigo, se algo me acontecer nestes tempos mais próximos. Podes crer – acrescentou com notória convicção – que se essa eventualidade acontecer contigo, eu também cá estarei para os teus projectos e equipa e darei o meu melhor para redesenhar o futuro. Farei o que puder, como sei que farás também, se for eu a partir primeiro.

O resto o leitor já sabe. Estamos aqui e de então até agora a Zilda Monteiro soube, e muito bem, aceitar e honrar o legado. Estamos-lhe muito gratos e compreendemos perfeitamente que se sinta cansada e que os tempos de mudança a chamem para outros desafios, se do Jornalismo se vier a afastar. Deixamos-lhe aqui, com verdade, afecto e sentimento profundo, o obrigado que todos nós reservamos para os melhores que fomos encontrando na estrada da vida.

Embora haja lugares e funções que são difíceis de substituir, a roda do tempo não perdoa e “O Despertar” passará a partir de agora para as mãos de uma nova Directora, com equipa renovada no estritamente necessário, mas continuando a fazer parte da mesma estrutura dos últimos anos. Vai empunhar esse facho de liderança editorial a Lina Maria Vinhal, já há alguns anos co-responsável pela gestão comercial deste projecto. Sejamos mais claros ainda: a Lina é minha filha, já nascida levava eu três meses e pouco de Jornalismo no “Diário de Coimbra”, projecto que então abracei durante cerca de vinte anos e fui muito feliz e onde tentei aprender um pouco do muito que me ensinou o então proprietário e Director do projecto, engº Adriano Lucas, um dos homens que mais sabia de imprensa em Portugal. O sol não se põe para todos ao mesmo tempo nem a horas certas. Quem ama os projectos, quem tem consciência que não leva o mundo para a cova, preocupa-se em anediar o caminho para quem se lhe segue. O Fausto Correia fez isso comigo. Eu, que pelo “Despertar” continuarei a dar algum do sangue que me corre nas veias, estou a fazer algo parecido. Entrego a liderança editorial do Jornal à Lina e entrego ao “Despertar” parte do melhor que a vida me deu: a minha filha, companheira de bastantes anos nesta caminhada que nos revitaliza a cada instante.

Recebam-na bem, caros leitores, assinantes, anunciantes e colaboradores. Apesar dos anitos que já leva disto, a ela tremem-lhe ainda as mãos com este desafio, sabendo embora que eu, enquanto me mexer, não andarei longe do chão que ela pisar. Mas a vida faz-se caminhando. E eu não quero que Coimbra perca o seu “Despertar” nem eu aceitei a incumbência de Fausto Correia para depositar o Jornal na sepultura da indiferença.

Continuem, peço-vos, a receber o Jornal com o carinho de sempre. Peço isso a Coimbra. Espero e desejo, ardentemente, que todos os Colaboradores – alguns tão amigos e de tantos anos – se continuem a si próprios, tão bem têm todos respeitado a dignidade da imprensa livre e responsável. Aceitem este repto: “O Despertar” há muito que deixou de ser um projecto editorial de alguém e passou a ser um projecto de todos. “O Despertar” é de Coimbra, porque ele é isso mesmo: Coimbra. Por dentro e por fora. Leiam-no, colaborem, critiquem, exijam, reprovem-lhe as atitudes de menor bom senso. Estas ruas de Coimbra, as instituições da cidade, as suas realizações, os seus feitos de maior grandeza e os outros, preenchem a vida deste Jornal.

À Lina Maria Vinhal, recebam-na bem, por favor, e ajudem-na. Ao Jornal não o abandonem. Vamos passar mais algumas poldras e levá-lo à outra margem. Todos juntos.


  • Diretora: Lina Maria Vinhal

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