Estando-se em pré-campanha eleitoral, será o momento azado para se refletir sobre o perfil de um dos elementos fundamentais da constituição da Assembeia Legislativa – o deputado – representante (político) da nação, do povo, eleito pelos cidadãos, considerados em si mesmos, daí a sua legitimidade, não estando sujeito a instruções ou a ordens dos seus eleitores em concreto, o que numa democracia não passa sem o seu enquadramento partidário, e a representação como que se duplica: opera através dos representantes e também dos partidos. Metaforicamente falando, trata-se de uma promoção dada a um número de cidadãos (deputados) pela massa do povo que quer que os seus interesses sejam por eles defendidos.
O cargo de deputado é, logica e pragmaticamente, de elevada responsabilidade e embora possa não ser conhecido pelo eleitor, contudo tem na mão um mandato político que, em nome desse mesmo eleitor, se propõe contribuir para a condução da política do país, de acordo com as propostas que de fora ou de dentro das hostes partidárias, pelas quais se candidatou, se compromete. Para tanto, rege-se por um Estatuto único, aplicando-se-lhe os mesmos direitos e deveres gerais, em cúmulo com condições específicas próprias.
Constitucionalmente, todos os cidadãos têm direito de acesso, em condições de igualdade e liberdade, aos cargos públicos, mas relativamente aos candidatos a deputados, trata-se de um direito de caráter político, que não se confunde com o direito de acesso à função pública.
Genericamente, pode apresentar-se a sufrágio todo o cidadão maior de 18 anos – à exceção dos que não possuem a cidadania portuguesa; com residência fora de Portugal; portadores de doença psiquiátrica; com pena de prisão temporária, etc. – para garantir a livre escolha dos eleitores e a autonomia, isenção e independência no exercício do cargo em apreço. Mas é omissa quanto ao grau das habilitações académicas, o que pressupõe ser bastante o mínimo da escolaridade obrigatória.
Admitindo-se, em princípio, que as mesmas são necessárias; mas suficientes para o desempenho das funções de deputado? Há críticos como Meneses Leitão, que refere não fazerem parte da elite das profissões, mineiros, eletricistas, pedreiros, serralheiros, etc., que o perfil de deputado resume-se a advogado, jurista, professor, apesar de considerar a presença destes uma mais-valia, cuja vantagem está em ter no Parlamento, que tem por funções a elaboração de leis, quem saiba o que está a fazer; que deve ser o espelho da sociedade, mas que é importante que tenha deputados oriundos de qualquer profissão, não fazendo sentido procurar estabelecer condicionantes eleitorais resultantes da profissão dos candidatos a deputados.
De acordo, por que o ideal é que o Parlamento seja, de facto, um cenáculo integrado pelo máximo de profissões diversificadas em prol de um maior conhecimento de causa nos debates, que devem ser o mais abrangentes possível. Todavia, no status quo atual não se ignoram situações menos honrosas que se observam na “Casa da Democracia”, com realce para deputados que estão calados, que não fazem perguntas ou intervenções durante toda uma legislatura; outros que em vez de se concentrarem nos debates optam por jogos de computador (do Parlamento); outros que cometem inverdades quanto à justificação das não presenças e/ou do local do seu verdadeiro domicílio, etc., com intenções que se adivinham.
Detetam-se ainda algumas inconformidades praticadas por deputados que em obediência estrita ao Estatuto de Deputado, deviam ser pessoas com prestígio, impolutos, íntegros em toda a sua amplitude, abstendo-se de comportamentos que põem em crise a Instituição e que não defraudem as expectativas e a dignidade dos seus eleitores.
Aferidas algumas das condicionantes impostas aos deputados, resulta do atrás referido serem insuficientes para colmatarem esses desvios da unidade integrativa das pessoas em causa o que, através de uma prognose da personalidade e da etiologia, causa desses desvios, contribuiriam para uma filtragem construtiva das condições necessárias para se candidatarem a deputados.
Sem quaisquer pretensões sentenciosas, é imperioso que o governo ou a A.R. se decidam pela criação de um Instituto focado na formação política e parlamentar dos candidatos a deputados leigos nessa área, com aproveitamento devidamente certificado, como conditio sine qua non, no quadro de uma avaliação do seu perfil psicológico, de cujo resultado dependeria a respetiva seleção, e ético deontológico, conferindo-lhes maior responsabilidade, eficiência, competência e transparência ao debate político e dotando o Parlamento de maior dignidade.