Tem 83 anos e é natural da Carapinheira da Serra e faz xailes à mão desde que se lembra. É assim Maria Alcide Rodrigues.
Maria Alcide Rodrigues foi, desde nova, habituada a ver a mãe a trabalhar na produção de xailes e, devido às dificuldades da vida, teve que começar a trabalhar também nesta arte, com cerca de 10 anos.
“Apanhei amor a isto e continuei”, afirmou a tecedeira.
Entretanto, segundo a mesma, houve uma altura em que deixou de se usar xailes, com a moda “do casaco comprido”.
Na altura, a franjedeira trabalhou na produção de calças e malhas e ingressou num Rancho Folclórico, manufaturando xailes para os membros do mesmo. Assim foi durante algum tempo, até que a Câmara Municipal de Coimbra conheceu o trabalho de Maria Alcide.
“Nunca mais me largaram”, disse, entre risos.
“A partir daí foi sempre a fazer xailes para todo o lado. É para festas, casamentos, e eu ainda tenho muito amor por esta tradição”.
“O Xaile da Tricana de Coimbra”: o que é e por que é tradição
A Tricana é considerada “a mulher de Coimbra”, sendo uma figura mítica e emblemática da cidade desde o fim do século XIX, que usava um traje próprio, composto por uma saia preta, um avental, blusa, lenço na cabeça e um xaile ao ombro.
É uma figura muitas vezes retratada na literatura portuguesa.
De acordo com Maria Alcide Rodrigues, a tricana era a namorada dos estudantes da Universidade de Coimbra, mas “eles eram maus para as tricanas”.
Atualmente, a franjedeira é a única pessoa em Coimbra que continua a produzir, mas tem tentado ensinar jovens interessadas para que haja, no futuro, alguém que saiba como se pode manter viva a tradição.
Os xailes são feitos com diferentes tecidos e, por esse motivo, também o tempo de produção é variável.
Por norma, e tendo em conta os clientes que costuma ter, Maria Alcide pede aos mesmos que escolham o tecido de acordo com a cor e textura que mais gostam. A partir daí “sou eu que faço”, diz a profissional.
De acordo com a mesma, e após a escolha do tecido, os xailes podem demorar entre dois dias e uma semana a serem feitos. Isto porque, há alguns mais fáceis de trabalhar que outros. Sempre que está desocupada, Maria Alcide refugia-se na paixão pela manufaturação de xailes, que há tanto tempo a acompanha.
O xaile tem de comprimento um metro e meio e o mesmo de largura, sendo a sua produção divida em quatro partes.
A franjedeira conta que os xailes estampados são mais fáceis e rápidos de fazer, uma vez que têm menos detalhes. Por outro lado, os xailes de seda requerem mais tempo e dedicação, dado o facto de serem feitos em fitilho e em “trancinha”.
Segundo Maria Alcide, os artigos costumam ser vendidos por, no mínimo, 100 euros. Caso seja um xaile mais complexo, o preço pode chegar aos 200 euros, nunca ultrapassando esse valor.
A produção de xailes é “uma forma de estar entretida. Se estiver em casa, a primeira coisa que faço são xailes”.
Ao longo dos últimos anos, a franjedeira tem corrido o país de norte a sul, confessando ser “sempre muito bem tratada” em todos os lugares por onde passa.
Confessa que o seu trabalho tem sido sempre reconhecido, principalmente pela Câmara Municipal de Coimbra.
“Estão sempre prontos para me receber”, conta.
Ainda que o avanço da idade constitua um problema para Maria Alcide, esta não se deixa ir abaixo, revelando que gosta realmente do que faz e que vai continuar a produzir xailes “até poder”.
Do longo número de anos que trabalha com clientes e tecidos, a franjedeira garante ter construído “muitas amizades”, tanto nas feiras e mercados que frequentava, quanto com os clientes, que com o passar do tempo se foram tornando habituais.
A profissional dá o seu melhor para continuar a tradição e não deixa que os xailes da tricana de Coimbra sejam “confundidos com os tecidos de Almalaguês”, afirmou, alegre.