Refletir acerca da obra e legado de Adelino Veiga (1848 – 1887), o Poeta-Operário, implica destacar tanto a relevância histórico-cultural e talentos literários e artísticos deste conimbricense como a sua configuração simbólica, cujos ideais de igualdade, fraternidade, liberdade e justiça social representam a defesa dos oprimidos e desamparados.
Oriundo de uma família de origens modestas, é filho de Maximiano Bento da Veiga e de Maria das Dores, tendo nascido na Baixa de Coimbra, numa casa humilde, localizada na Rua das Solas, n.º 19, artéria urbana cuja atual designação de Rua Adelino Veiga resulta da petição toponímica solicitada pela Federação das Associações de Classe, em 1908, aprovada pela Câmara Municipal de Coimbra no mesmo ano civil. Com o progenitor aprendeu a arte de barbeiro, passando a consertador de chapéus de chuva, latoeiro de amarelos, chapeleiro e construtor de redes de arame, instalando a sua própria oficina de reparação de chapéus na Rua Nova da Rainha, na atualidade denominada de Rua da Sota, onde se encontra situada a Agência do Banco de Portugal. Em virtude de dificuldades económicas, não termina a instrução primária, circunstância que sempre lamentou. Todavia, a sua vontade de saber e formação intelectual não são descuradas, tornando-se num autodidata, sobressaindo o seu pendor criativo e artístico, conforme atestam testemunhos que o encontram, desde os 15 anos, a versejar, com espontaneidade, no Café da Alexandrina, muito frequentado por operários, situado, à época, diante da Igreja de São Bartolomeu.
Adelino Veiga afirma a sua multifacetada personalidade em variados campos de atividade cultural e cívica, entre os quais se destacam: (1) A Guitarra de AlmaViva (1ª edição – 1876; 2ª edição – 1882), obra na qual tanto dá voz às adversidades vivenciadas palas classes mais desfavorecidas como dedica poemas a Coimbra e Santa Clara; (2) A Lyra do Trabalho (1885), compreendida por composições poéticas nas quais valoriza o trabalho, por si entendido como uma fonte de inspiração e bem-estar; (3) Contribuição com trovas populares para as Fogueiras do Largo do Romal, Santa Clara e de São João; (4) Como ator teatral, escreve a cena de cariz cómico Na Parvónia (1881); (5) Convidado enquanto conferencista no Ateneu Popular (1886), no qual disserta acerca da importância do trabalho e da instrução; (6) Autor do Hino da Escola Livre das Artes do Desenho (1882); (7) Funções jornalísticas como redator principal em A Voz do Artista (1878), Jornal dos Artistas (1878) e colaborador em A Voz do Mondego (1870) ou A Oficina (1883), no qual cria um segmento intitulado Galeria Operária, desenvolvido para homenagear nomes como o de João Machado; (8) Integra como diretor, encenador, ensaiador e ator amador várias sociedades dramáticas e amadoras de Coimbra, tais como a Sociedade de Teatro das Escadas de São Tiago (1859), Sociedade do Teatro das Lages (1861), Sociedade do Teatro de Santa Clara (1862), Grémio Dramático Conimbricense (1871), Sociedade Dramática da Rua dos Sapateiros (1876) ou Sociedade Dramática Conimbricense (1883); (9) Agraciado com o grau de sócio honorário da Associação de Socorros Mútuos dos Artistas de Coimbra (1885), juntando-se, nesta homenagem, a Amélia Janny, poetisa conimbricense; (10) Participante em atividades associativistas, sendo 1º Secretário do Centro Operário de Coimbra, constituído em 1881, com o propósito de promover e manter tanto a união e solidariedade das classes trabalhadoras como a moralização e disciplinação do povo, por forma a obter a sua legítima influência e representação política e social; (11) Ativista do Movimento Republicano em Coimbra (1881), do qual faziam parte, entre outros, António Augusto Gonçalves e José Falcão.
Nas palavras de Joaquim Martins de Carvalho, Adelino Veiga não dispunha de graus e diplomas universitários e, contudo, sobressaía pela sua inteligência, conhecimentos e variadas aptidões. De igual modo, o seu funeral foi uma demostração de consagração e homenagem, no sentido em que foi acompanhado por uma enorme multidão, emocionada e deferente. O Poeta-Operário provou que a manifestação e partilha do talento não são exclusivas da parte de quem possui privilégios sociais ou económicos, tendo evidenciado que as contrariedades e obstáculos estimulam a construção de uma sociedade democrática, promovendo a luta contra o obscurantismo social e individual.