No quartel final do século XIX, Lisboa testemunha a construção de novos edifícios imponentes, particularizados por estéticas heterogéneas, erigidos por capitalistas de áreas diversas, sendo, igualmente, visível, no Porto, o desenvolvimento e crescente modernização do edificado urbano por parte de uma ascendente aristocracia inglesa. Por oposição, embora manifeste uma expressão representativa de setores secundários e terciários, Coimbra apresenta uma paisagem arquitetónica e artística estagnada. No entanto, com a fundação, em 1878, da Escola Livre das Artes do Desenho, liderada por António Augusto Gonçalves, vulto maior da memória conimbricense, uma nova dinâmica cultural é definida na urbe.
A Escola Livre, instalada na Torre de Almedina, teve, mediante os seus Estatutos, aprovados em 25 de outubro de 1880, o propósito de promover o estudo do desenho numa perspetiva artística, industrial e fabril, capacitando, sobretudo a classe operária, com uma formação teórica e prática qualificada, no contexto da cerâmica, cantaria, marcenaria, entalhe, escultura ou serralheria, contribuindo para criações individualizadas de reconhecida excelência. Neste sentido, valoriza-se tanto o conhecimento da História da Arte, cuja disposição perante movimentos revivalistas é visível nas materializações criativas dos artífices, como a realização de excursões de estudo a monumentos vários, com o objetivo de ampliar as competências artísticas dos alunos. De igual modo, a Escola Livre assume a organização da Exposição Distrital de Coimbra em 1884, contextualizada na esfera das artes decorativas e manufaturadas (mobiliário, ourivesaria, encadernações, fábricas de papel, ferro forjado…), tendo sido complementada por conferências várias, intervencionadas, nomeadamente, por Joaquim de Vasconcelos, intelectual de referência no estudo da arte portuguesa. É neste ambiente de estímulo criativo, facultado pela Escola Livre das Artes do Desenho, que se destaca o génio criador de artistas como o canteiro decorador e escultor João Machado e os artífices do ferro forjado Daniel Rodrigues e Lourenço Chaves de Almeida.
Muitíssimo mais se poderia dizer acerca da Escola Livre, da sua contribuição e dos seus associados, mas o espaço físico para a redação deste artigo é limitado. Fica, no entanto, o seguinte apontamento: é importante o restabelecimento do legado cultural, artístico, social e histórico da Escola Livre das Artes do Desenho.