COMUNIDADE | Há 3 anos a funcionar em Coimbra, o café “The Living Room” apresenta um conceito diferente: as mesas têm de ser partilhadas, com o objetivo de promover o convívio entre pessoas que não se conhecem. Além disso, o espaço contribui para o dinamismo da cidade, organizando diversos eventos culturais.
Ali, nada é inocente. Não existe a separação de mesas que se vê nos cafés tradicionais, o calendário, – que pode ser observado mesmo à porta -, está sempre preenchido, e até a morada foi pensada ao pormenor. O “The Living Room” nasceu na Avenida Dr. Dias da Silva, em Celas, com o propósito de unir a comunidade local.
Durante a semana, o espaço funciona como um “coffee shop”, no entanto, aos sábados e domingos transforma-se num verdadeiro palco de atividades culturais. A viver em Coimbra há vários anos, o casal norte-americano, Cristi e Michael Gerecke, orgulha-se de ter trazido este novo conceito para cidade.
“Lisboa e Porto já têm alguns cafés deste género, mas Coimbra ainda não tinha. Neste momento, temos muitos alunos de Erasmus a frequentar o nosso espaço, porque se sentem em casa. Os estudantes da Alemanha e da Polónia, por exemplo, adoram o café porque é do estilo a que estão acostumados”, explica Cristi Gerecke, em declarações ao “O Despertar”.
Sublinhando que “o nosso objetivo é mesmo encorajar as pessoas a conviver um pouco mais”, a responsável admite que é importante trazer novidades para cidade, contribuindo para a sua dinamização. “A nossa atitude é: em vez de nos queixarmos daquilo que Coimbra não tem, vamos trazer o que lhe falta; vamos fazer algo novo; mudar um pouco as coisas”, reitera.
Habituados a receber, frequentemente, pessoas na sua casa, Cristi e Michael consideraram, por isso, que estava na altura de encontrar um sítio de maior dimensão. Depois de muita investigação, abrir o “The Living Room”, na Avenida Dr. Dias da Silva, pareceu a melhor opção. “Escolhemos esta rua para estar no meio de todo o tipo de pessoas”, conta a fundadora, acrescentando que “temos a Faculdade de Economia e uma escola primária aqui ao lado, e, depois, passam muitos idosos por aqui”.
Café procurado, sobretudo, pelos jovens
São muitos os que, diariamente, passam em frente ao “The Living Room”. No entanto, há quem espreite lá para dentro e se fique por isso mesmo. De acordo com Cristi Gerecke, as pessoas mais velhas tendem a estranhar o conceito e a não entrar. O caso muda de figura quando se fala de famílias e pessoas mais novas. “O nosso público é um pouco mais jovem”, garante.
Em causa está o facto deste não ser um café tradicional. Aqui, não vale a pena pedir uma mesa para se sentar a sós ou com a companhia que levou. As mesas têm um formato retangular e comprido precisamente para incentivar o convívio entre desconhecidos. “Quando uma pessoa entra e pede uma mesa, eu sei que é a primeira vez que vem cá”, diz a responsável, entre risos. Cristi adianta, assim, que partilhar o espaço é obrigatório. “O espírito é esse: falar com outras pessoas (…) É um café pensado para que conversem e convivam umas com as outras”, salienta.
Quem já se habituou a este conceito, não só tem tendência a voltar como a trazer alguém consigo. Cristi admite que grande parte da população conimbricense ainda não sabe da existência do “The Living Room”, contudo, não se importa. Assume que não pretende fazer qualquer tipo de publicidade, já que a que considera melhor é o “passa-a-palavra” e, nesse aspeto, tudo tem corrido pelo melhor. “Já somos muito importantes aqui na rua. Havia pessoas que não se conheciam e que se conheceram no nosso espaço. Até já há um casal que se conheceu aqui”, orgulha-se.
Atividades ao fim-de-semana
A vontade de criar um espírito de comunidade entre aqueles que frequentam o espaço estende-se aos fins-de-semana. É nessa altura que o “The Living Room” organiza vários tipos de atividades. Entre noites de bingo, jogos e workshops, há opções para todos os gostos. Além disso, há também uma iniciativa chamada “jantar de bairro”, onde a comunidade se reúne para jantar em conjunto, e um “Clube do Livro” que, todos os meses, promove encontros entre amantes de leitura.
“Sempre quis fazer parte de um [Clube de Leitura], então arrisquei e correu bem. Logo, no início, tivemos cerca de seis mulheres a aparecer. Agora, temos 25, que vêm quase todos os meses. Têm sido mesmo só mulheres”, assegura Cristi Gerecke. São também mais de 25 os livros que já foram lidos e debatidos.
O conceito é simples: todos os meses, é definido um livro que as pessoas devem ler. Posteriormente, na sessão marcada, os leitores vão debatê-lo durante, aproximadamente, uma hora. Este ano, Cristi Gerecke sugeriu uma espécie de “volta ao mundo”, ou seja, as obras escolhidas teriam de ser de vários países, por forma a diversificar os géneros e aprender sobre outras culturas.
Assim que o mote foi dado, começaram a surgir diversas sugestões que podem ser lidas em português e em inglês. “Eu nunca escolho os livros. São sempre as pessoas que sugerem”, revela. Quem tiver interesse em participar neste Clube do Livro pode, simplesmente, consultar o calendário que está à porta do “The Living Room” e aparecer na data agendada.
Há, inclusive, quem participe sem ter sequer lido o livro do mês. “Aparecem só porque gostam de estar com outras pessoas. Gostamos de passar tempo juntos”, refere Cristi, realçando que “é divertido e é bom para sair de casa; estamos com pessoas diferentes”.
Para finalizar este ano da melhor forma, o “The Living Room” recebeu, recentemente, um workshop de colagens e dinamizou uma sessão que permitiu aos participantes construir as suas próprias casas de gengibre. Para o Natal, está a ser organizado um jantar destinado a estudantes que não têm a oportunidade de ir a casa visitar as suas famílias.
Em janeiro, o projeto promete voltar em força com as atividades. “Notamos que as pessoas ficam mais tristes em janeiro, por isso, provavelmente vamos fazer mais coisas nesse mês do que temos feito em dezembro”, conclui.
Cátia Barbosa
»» [Reportagem da edição impressa no “O Despertar” de 19/12/2025]