14 de Fevereiro de 2025 | Coimbra
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ANTÓNIO INÁCIO NOGUEIRA

Testemunhos: pedaços de mim

27 de Agosto 2021

A poesia, na minha modesta opinião, é um modo de contar a vida, a vontade de viver ou não, as suas memórias, os imaginários, os estados de alma.

O poeta para mim, o bom poeta, é um mágico, um dançarino que impõe um ritmo às palavras que escreve, em qualquer lugar, em qualquer momento, num papel amarrotado ou na palma da mão, por vezes nem ele entende porquê ali e agora.

O poeta é um adivinho que, num ato repentista, exprime sentimentos, mágoas, alegrias. O poeta escreve impulsionado por alguém, por coisas, por tudo, por isso também, uma forma de meditação solitária e única, encantatória.

Como vão ver, sei pouco de poesia, talvez debite palavras com algum sentido harmónico. No entanto, para espanto de muitos, sou um «escrevinhador» de poesia.

Rabisco em qualquer lugar, em qualquer suporte, quando o sentimento se empenha, ou a euforia e o seu contrário tomam conta de mim. Versejo por entre os dedos da poesia.

Por exemplo: um dia, recentemente, desloquei-me à terra da minha mãe e onde vivia a minha avó (Amoreiras do Mondego, perto da Guarda), ambas já falecidas. Ali, naquele lugar pobre, passei muitas férias escolares na minha juventude. Num pequeno papel fui escrevendo a contemplação e as memórias desse regresso.

Pedaços de Mim

Pedaços

Que são laços.

Laços que são memórias,

Lá dos confins

Dos tempos e das histórias,

Contadas para mim,

P`la Jacinta, minha avó,

Junto à lareira, dos fins,

Daquelas noites frias.

Para mim, petiz, todas as noites eram Natal,

Natais,

Sempre Natais.

Fantasiando, no regaço d`avó comia uma filhó,

Pedia ao Menino as prendas natalícias,

E entoava as quadras das Janeiras.

Sonhava, e largava perto das brasas as botas vazias,

Para que cheias, todos os dias, se tornassem.

Depois, fantasiava com o meu palhaço de trapos feito,

Um pobre perfeito.

Desesperado, percorria o vale de Orfeu,

E aí um mundo melhor era meu.

Hoje revisito os tempos de passagem,

Que são ecos, traços e pedaços de mim,

Memórias sem fim,

Da já ausente terra de velhos povoada.

Caiu -me a última lágrima de velho, – salgada.

Adeus terra de memórias amada.


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