Recentemente faleceu Agustina Bessa-Luís.
Raras vezes o desaparecimento de um escritor despertou tamanhos elogios, – tão concordantes. Desde os órgãos de comunicação social, de todos os diversos tipos, passando pelos grados intelectuais da coisa literária, até ao cidadão comum, todos participaram, condoídos e unânimes, nestas condolências. E, olhe-se de espanto,… , também todos aqueles que lhe foram maldizentes se apresentaram a terreiro. Foram tantos, carpindo os seus remorsos com lágrimas de mau pagador!
As editoras também não desaproveitaram tempo e colocaram em escaparate todos os seus livros, alguns dos quais já não viam a luz do dia há muitos anos. Era preciso aproveitar e vender… Agora tudo era bom, sem mácula, quando anteriormente havia tanto para criticar.
A turbulência do carpir foi geral, mas, como de costume, tudo se apagou.
A partir daquele dia, só muito esporadicamente, Agustina não estará só no silêncio do túmulo.
Não tenho dúvidas e a minha proveta idade confirma-o: depois da morte estaremos sempre sós, sejamos conhecidos ou desconhecidos, altas personalidades, benfazejas ou criminosas, artistas ou pobres de rua. Morre-se sempre só!…
Numa das cartas escritas a Balsemão reveladas pelo Expresso de 8 de junho de 2019, Agustina afirma que revelar-se a si própria é a maior paixão da sua vida. E revelou-se, por isso, teve muitos detratores.
Agustina, afirma-se no mesmo jornal, seria a primeira a estranhar esse unanimismo, ou até a desconfiar da sinceridade dos que agora a incensam, porque sempre defendeu posições fortes, muitas vezes contra a corrente, e revelou aversão aos consensos. Era ela que dizia a este propósito, “sou mais conhecida do que lida”. E era verdade. Foi, por isso, que muitos dos seus livros moribundos no alçapão das livrarias, eis (!), por milagre, a saltarem para feiras e para os escaparates de ouro dos principais expositores…e, são cerca de 50 livros de ficção, é obra.
A folha em branco nunca a assustava. Era preenchida com fluidez, sem emendas; à primeira «penada» tudo estava feito.
Génio e figura não se distinguem em Agustina Bessa-Luís, afirma Pedro Mexia. E vai mais longe: há em todas as artes os chamados génios não apenas no sentido de serem autores “inspirados” ou “talentosos”, mas de serem personalidades inconfundíveis. Em cada leitura descobre-se um génio de inteligência, sageza, liberdade, ironia e estilo, mas também uma figura indomável, surpreendente, lírica, sarcástica, exacta e feroz.
Agustina era isto, porventura, muito mais. Por isso, o silêncio vai perdurar. Quanto tempo?