Escrevo hoje sobre a última manifestação de Polícias e Guardas, ocorrida em novembro de 2019, onde se incorporaram cerca de 13.000 Agentes de Segurança dos cidadãos, ao chamamento de alguns dos seus sindicatos mais representativos e de uma organização inorgânica, sem dirigentes que deem a cara, que se apelida de ZERO. O seu ponto de encontro final foi a Assembleia da República, como é habitual, e correu de forma pacífica e ordeira, se compararmos com a última realizada.
Todos estão recordados da cena que estes agentes de segurança protagonizaram, na altura, ultrapassando à força o primeiro cordão policial, depois de terem derrubado as barreiras de metal, chegando a subir muitas das escadas da Assembleia da República, onde foram travados. Pensava eu, na altura, – o que aconteceria como represália policial se fosse uma manifestação civil a quebrar o cerco e a tentar subir a escadaria? Os nossos agentes, com esta atitude, desafiaram a autoridade e fizeram uma tentativa de invasão de um órgão de soberania que juraram defender, a todo o custo.
Estas manifestações destinam-se, normalmente, a reivindicar melhores condições de trabalho, remunerações e condições de segurança que permitam o seu desempenho capaz.
Permitam-me informar de que sou parte interessada no problema, já que tenho um familiar, muito próximo, agente policial. Através dele posso relatar as más condições de trabalho e de vida a que estão sujeitos, desde há muitos anos, atravessando vários governos.
Pelo que me é dado saber, de forma direta, as insuficiências situam-se ao nível do Terceiro Mundo e não de um país, dito desenvolvido, parte integrante da União Europeia: vencimentos de miséria que obrigam muitos a procurar serviços gratificados para equilibrar a subsistência; falta de residências, ou melhor, de camaratas, sendo as que existem falhas de condições mínimas e dignas; armas antigas com deficiente funcionamento; materiais de suporte à segurança que já não são eficazes, por ultrapassarem os prazos de validade, automóveis em estado lastimável, etc, etc, etc.
Esta lista, muito incompleta, leva-nos a considerar que os motivos da manifestação são justos.
Analisada esta primeira problemática, vamos agora dissecar um problema que considero grave, já descrito por vários analistas, mas que nunca é demais repetir, até porque mancha e de que maneira esta manifestação e os seus participantes.
Refiro-me ao movimento ZERO, se é assim que se escreve.
A proximidade entre este movimento sem rosto, nascido há seis meses no Facebook , após a condenação de oito agentes da PSP por agressões a jovens da Cova da Moura, e o partido CHEGA, ficou visível nos aplausos dirigidos a André Ventura durante o mini comício que este protagonizou perante aqueles milhares de polícias e guardas.
Grupo ZERO que atua de sobremaneira nas redes sociais apelando à participação, apresentando reivindicações sem coerência e invocando à desordem e ao confronto também.
Alguns dos seus líderes informais, segundo se diz e consta, estão ligados ao partido de André Ventura. Durante a manifestação, agentes e militares, não a maioria, levantaram os braços, fazendo o símbolo Zero (white power), “Poder Branco”, desenhando a letra W de (white), “branco” e amoldando o P de (power). [leia-se, Marta Gonçalves e Rui Gustavo, Expresso, 23 de novembro de 2019].
Muitas das pessoas sabem que André Ventura quer o fim dos sindicatos tradicionais; segundo o seu pensamento, chegou o tempo da espontaneidade. Terá sido espontânea, na sua lógica de pensamento, a presença no protesto envergando uma t-shirt do movimento ZERO.
As t-shirts brancas e negras, estiveram bem presentes na manifestação e, em muitos pulsos, albergava-se uma fita estreita, ao jeito de pulseira, onde se lia movimento ZERO.
Não é esta Polícia de Segurança Pública ou, esta, Guarda Nacional Republicana com ZERO que eu quero. Não pretendo a polícia White Power. Quero a outra polícia a que estive habituado, que pugne pelos ideais democráticos, não racista, não xenófoba, que defenda e dê segurança a todos, independente da cor da pele, do seu estado de riqueza ou pobreza, vivam em bairros de lata, na rua, ou, em condomínios de luxo.
Se assim não for, pela minha parte, jamais apoiarei a Polícia de Segurança Pública e a Guarda Republicana, como até aqui. Levantarei bem alto a minha voz, sempre contra, até que a goela me doa.