“A relação entre doenças cardiovasculares e diabetes é, do ponto de vista da saúde pública, preocupante e perigosíssima”, alerta o cardiologista Carlos Aguiar, no âmbito das comemorações do Dia Mundial da Diabetes, que se assinalou anteontem, 14 de novembro.
O especialista adverte para as complicações nem sempre tidas em conta pelos doentes e partilha a sua preocupação com os fatores de risco que, conjugados, podem exigir maiores cuidados. “A mortalidade por doenças cardiovasculares tem vindo a diminuir, o que mostra os benefícios do controlo dos fatores de risco. Mas, apesar disto, tem havido um aumento da prevalência da obesidade, que é um caminho para a diabetes do tipo 2. A minha preocupação é que este aumento de obesidade e diabetes venha a causar uma inflexão na mortalidade cardiovascular”, realça.
Isto porque o risco cardiovascular é elevado entre os doentes com diabetes. Jácome de Castro, endocrinologista, confirma que “as doenças cardiovasculares são a principal causa de morte entre os diabéticos”, sendo responsáveis “por mais de 50 por cento da mortalidade”. A diabetes continua a ser uma doença por controlar em Portugal e, de acordo com o especialista, no Atlas da Federação Internacional da Diabetes de 2017, “Portugal representa uma das manchas mais escuras da Europa”. É, por isso, importante passar a mensagem de que, “para além do rim, do olho e das amputações, a doença cardíaca e a mortalidade cardíaca são um dos principais inimigos a ter em conta na diabetes, porque é por isso que os doentes morrem”, alerta.
Carlos Aguiar reforça também que importa não esquecer que “esta é uma doença que vai resultar numa perda de tempo de vida” e que “quando há uma doença cardiovascular associada a nossa esperança de vida é encurtada em oito, nove anos, em média”. Se tivermos também diabetes, sublinha, “a ligação é realmente perigosa, ou seja, o tempo de vida é ainda mais curto”.
Um diagnóstico atempado, que permita evitar as complicações associadas à diabetes, entre as quais as cardiovasculares, é cada vez mais um desafio. Segundo Jácome de Castro, estima-se que, em Portugal, cerca de 30 por cento dos doentes com diabetes não estejam diagnosticados. “Isto quer dizer que as pessoas vão vivendo sem saber que têm a doença e esse tempo em que estão sujeitas a valores altos de açúcar vai destruindo o seu organismo”.
“Estamos hoje num momento de grande desafio, em que estão a aparecer ensaios clínicos muito importantes, que introduzem fármacos com novos mecanismos de ação, novos fármacos que atuam ao nível do rim, da inflamação, da parede dos vasos, que influenciam o prognóstico das doenças cardiovasculares e que se afiguram protetores do organismo. A nossa preocupação é, por isso, atuar cada vez mais cedo. Não podemos contentar-nos apenas em tratar bem os doentes que nos aparecem com as complicações. Temos que conseguir prevenir o mais possível essas complicações. E nesse aspeto, os resultados dos estudos clínicos recentes colocam-nos num momento muito interessante ao nível da clínica de diabetes em Portugal e no mundo”, esclarece.
A tudo isto junta-se a importância do cumprimento terapêutico. “É uma pena termos medicamentos que devolvem a esperança de vida, mas que depois o doente não toma”, reforça Carlos Aguiar.