Ser multifacetado. Poeta e pintora. E palestrante que prendeu uma multidão de admiradores. Assaz diferente que se fez rodear de uma segurança professoral no trato do verso e duma forçosa ortodoxia conceitual. Pintava de preferência “naturezas-mortas” e a sua última exposição quando tinha oitenta e cinco anos foi um êxito. Um grito de aleluia quando estava no fim da vida que veio acontecer passados quatro meses. Foram oitenta e cinco anos de magia, de surpresa, de uma arte de vários ângulos.
Poetisava num sabor simbolista que encantava os amigos à mesa do café.
A pintora e poeta de nome Margarida de Castro usava a metáfora e uma linguagem acentuadamente profunda e extensa como usasse a tese aristocrática ou o pendor filosófico onde, amiúde, surge o corpo e o espírito do verso numa paisagem platónica ou numa contemplação de inspiração agónica tornando, não raro, a poesia um canto na busca duma identidade que se vai harmonizando através de páginas na visão de Deus ou na salvação do mundo, ou seja, o verso é essência que lhe dá por acréscimo e unidade e a verosimilhança da beleza do ato de existir na comunhão com o mundo.
A heterogeneidade da sua cultura, a criação bem vistas as coisas, é em Margarida de Castro uma atitude social com o traço formal dum triplo critério: o simbolismo partilhado pela lógica, as imagens dadas pela frieza germânica e o descritivo dum ser que não se encontra porque o seu espírito e o seu coração está espalhado pelos amigos que são todo o universo.
Encontrou uma sociedade – e até o mundo culto – na sua batalha com o pensamento, com as letras, com os óleos dando a sua beleza aos outros.
Morreu há pouco tempo. E os carolas à mesa do café têm ainda, e sempre, no ouvido e no pensamento, o verbo, o seu traço na pintura, o seu humanismo, o dom que Deus lhe deu.
E nós, todos que lidaram com esta mulher simples e culta ficámos mais pobres, com a sua ainda recente partida para outra vida…
Artista que foi de enorme talento, lembra na pintura Pedro Olaio (Filho) e Luís Pimental, desiguais na dualidade de critérios, e ainda Isabel Zamith; e na poesia o barroco ou pedaços de António Nobre, o poeta do “só” ou duma tristeza infinita derivada da solidão do homem só, cerrado de arame farpado não tendo ninguém com quem partilhar…
A poesia é, por vezes, uma salvação!