São consideráveis as palavras e expressões que sorrateiramente caminham e se intrometem nas falas e na escrita, assentam arraiais em obras e desafiam os nossos olhos, ouvidos e entendimento. Por norma entroncam ou agrupam-se por ciclos míticos ou culturais.
Começo por expressões e termos que encontram a sua origem na mitologia, mais especificamente na tradição épica, em especial a relacionada com a Guerra de Troia.
Troia era uma cidade próspera E, por falar em Guerra de Troia, vou partir da expressão que está no começo de tudo, pomo da discórdia. Alude o sintagma a episódio verificado durante o casamento de Peleu com a Nereide Tétis que ocorreu no Monte Pélion, com presença de todos os deuses – Olímpicos, Musas, Nereides, Centauros –, com exceção de Éris (Discórdia entre os Romanos). E quem aceita de bom grado a discórdia em uma festa sua? E muito menos a convida ou chama… Todos os deuses trouxeram e ofertaram os seus presentes. E também a deusa Éris, despeitada embora por não ter recebido convite para as núpcias de Peleu e Tétis, não deixou de à boda também levar o seu. Aproveitando um momento de descuido do guarda das portas, entra furtivamente no local do festim e coloca sobre a mesa, em que se encontram Hera, Atena e Afrodite, uma maçã ou pomo de ouro, com os seguintes dizeres: «Para a mais bela». Logo se gera a confusão e entre as três deusas surge a discórdia que vai motivar o Julgamento de Páris e dar origem à Guerra de Troia de tão funestas consequências. Por altura do nascimento do filho Páris, sonhara a rainha Hécuba que dava à luz uma tocha que incendiava a cidadela. Interpretado o sonho como um presságio de que a criança que ia nascer seria a causa da destruição de Troia, Príamo é aconselhado a eliminá-lo. Exposto no Monte Ida, na Ásia Menor, Páris é recolhido e criado por pastores que lhe dão o nome de Alexandre (“o Protegido”). Mais tarde dá-se o seu reconhecimento e Príamo acolhe-o de novo na casa real, como seu filho. É a Páris, então pastor no Monte Ida, que Zeus, talvez por não querer decidir questão tão delicada, envia Hermes com as deusas, para que ele decidisse a contenda. Cada uma delas procura aliciá-lo com promessas: dar-lhe-ia Hera o domínio sobre toda a Ásia; Atena conceder-lhe-ia a sabedoria e a vitória nos combates; Afrodite oferece-lhe apenas o amor da mulher mais bela, Helena. Páris acabou por entregar a maçã a Afrodite. Mais tarde, em viagem, o filho de Príamo é recebido como hóspede por Menelau e, durante a ausência deste, parte com a mulher do rei de Esparta, Helena, para Troia, cometendo grave falta contra os deveres da hospitalidade. Tal procedimento do príncipe troiano motiva uma expedição de todos os Aqueus para vingar a afronta: cercam a cidade e, após longa guerra de dez anos, acabam por a conquistar e destruir.
E assim a maçã ou pomo da Discórdia ou Éris se tornou causa de guerra funesta que originou a destruição de Troia e provocou a morte de muitos, tanto vencidos como vencedores.