Não conheço todos os pormenores da vida do Eng.º Valdemar Caldeira, figura que recentemente nos deixou. Mas reconheço algumas variáveis que fizeram dele um ícone de Coimbra Contemporânea: o despojamento dos bens materiais face a uma herança que terá recebido e que distribuiu pelos mais necessitados, o ter sido professor da Universidade, as explicações gratuitas de Matemática, a rejeição da reforma do Estado ou a decisão de viver a sua existência com o mínimo de condições de sobrevivência numa casa simples da Cidreira, o deambular pelas ruas da cidade e região, meditando, sempre de gravata e cabisbaixo.
Alguém mais apto do que eu poderá avaliar o perfil psicológico do engenheiro, que no meu entender oscila entre a genialidade e a loucura benigna, com implicações no estilo de vida, nas opções que tomou e que fizeram dele alguém “diferente” pela singularidade cognitivo-comportamental que aos poucos conquistou o coração das gentes de Coimbra.
Fala-se agora numa homenagem póstuma. E é neste ponto que o meu espírito se sobressalta, pois não consigo compreender a razão que leva seres humanos a esperarem pela morte dos seus semelhantes e a quem reconhecem qualidades morais para enaltecerem as qualidades e virtuosidades. É uma perversidade sem qualquer lógica cuja argumentação refuto quase por completo.
Pergunto-me hoje, ontem e sempre: que sentido faz homenagear alguém depois de partir, quando existiu a possibilidade em vida de demonstrar a estima, o reconhecimento, o exemplo? A não ser que os homenageantes queiram brilhar mais do que os homenageados e tudo não passe de um movimento aparente de boas intenções, idêntico a tantos outros em que – segundo reza a ideologia e teologia cristã – está o inferno cheio.