Em seguida à morte de meu pai, em 1935, o Prof. Bissaya Barreto de quem era em regime de exclusividade motorista há cerca de vinte anos, promoveu a minha entrada, em regime de externato, no “Ninho dos Pequenitos”.
Esta foi uma das obras pioneiras das suas muitas iniciativas dedicadas à assistência social e situava-se nos terrenos onde hoje está instalado o Teatro Gil Vicente, a Associação Académica e outras parcelas universitárias.
As crianças de então, eu tinha três anos de idade, de ambos os sexos eram orientadas num sentido católico por freiras, algumas de nacionalidade francesa. Fiz parte dum grupo de escuteiros (lobitos) e entre as atividades desenvolvidas encontrava-se o teatro com pequenas récitas durante o ano letivo.
As férias de verão tinham quinze dias passados na praia da Figueira da Foz, em regime de colónia, com espaço de areal reservado e banheiros a mergulhar-nos nas ondas, com exagerado entusiasmo.
Recordo o nome de alguns colegas de então, de que perdi o rasto, o Raul Miranda das Neves, da Arregaça, o José Martins do Nascimento e sua irmã Isabel, do Tovim, e o Joaquim, conhecido pelo Joaquim Mau, da Rua do Corpo de Deus.
Lembro com muita gratidão a ação ali desenvolvida pelo Dr. José dos Santos Bessa, duma dedicação enorme por nós, dedicação partilhada por algumas freiras das quais recordo uma de nome Adosinda com quem tive o gosto de contactar mais de cinquenta anos depois.
Foi graças a ela que nasceu em mim o interesse pela arte de representar. Mais tarde, já adolescente, apreciei o trabalho feito por um grupo de salatinas, levados pela destruição da Alta para o Bairro de Celas, onde o senhor Artur Cunha levou o teatro da Alta. Lá participaram, entre outros, o Aníbal Paiva , o Virgílio Augusto, em espetáculos que chegaram a ter lugar ao ar livre no então recentemente alcatroado campo do Olivais.
Assistia, nessa época, a todas as representações teatrais que tinham lugar no Teatro Avenida. Ali vi revista, comédia, drama. Dali, entre os demais recordarei sempre a inesquecível “Esta noite choveu prata” só possível de levar à cena graças ao talento incomparável de João Vilaret.
Com o casamento e a vinda para Ceira o gosto pelo teatro arrefeceu mas ele desabrochou quando o sempre muito meu saudoso Amigo Dr. Chaves e Castro, que recentemente instalara em Ceira a Casa do Povo, me ofereceu a oportunidade de integrar um grupo de teatro que ali então se esboçava.
Tive esse grato privilégio. Constituímos ali uma segundo família. Fizemos algumas dezenas de representações. Com diferentes obras. Em variados locais.
Com um espírito de entre ajuda notório, laços de amizade fortes, tivemos o gosto de encher sempre os locais onde atuávamos. Os anos passaram. Hoje são recordações para os que restam. O Fernando Ricardo. O Abílio Isidoro. O Armando Justo. O Ângelo Santos. Recordando aqueles com quem um dia nos voltaremos o juntar. O Carlos Damas. O Joaquim Basílio. O Fernando Chim. O António Pereira. O Armando Santiago. A Ilda Fidalgo. A Mirita. O Vítor Justo.
Não devo ocupar mais espaço por hoje. Mas voltarei de seguida às minhas recordações da arte de Talma.
Hoje,graças a “O Despertar” vivi. Recordar é viver.