No doce e memorioso remanso da minha infância, em Miranda do Corvo, ali pelos finais dos anos cinquenta, recordo-me de ir aos canaviais colher ecológicas canas para com elas fazer SPUTNICKS. Atirava-as ao ar apenas com a força pueril do braço, mas sei que houve colegas que lhes meteram “bombinhas de Carnaval”. E, claro, subiram mais alto. E muito. Era moda: os soviéticos de então e em plena Guerra Fria procuravam e conseguiam vencer a corrida espacial. De súbito, e depois dos apelos de um jovem presidente, John Kennedy, os americanos meteram o Homem a pisar a lua. Com direito a bandeira. FANTÁSTICO. Dois pisaram a Lua e um terceiro astronauta, MICHAEL COLLINS, pilotou a nave. O primeiro a pisar a Lua foi NEIL ARMSTRONG que se antecipou ao seu companheiro BUZZ ADRIAN. Já foi há cinquenta anos que se assinalam neste sábado, dia 20. Então, a caminho dos vinte anos e já esquecido da minha odisseia com os sputnicks e com os Beatles fora de órbita tive direito a assistir ao MOMENTO HISTÓRICO, confortavelmente, na televisão da sala, a única que havia em casa – e não havia muitas casas com tv. Creio que foi por volta da uma-e-tal da madrugada com a televisão portuguesa a prolongar a emissão antes de nos dar, pomposamente, a mira técnica que se eternizava até ao meio do dia seguinte. Em flashback: no dealbar dos anos sessenta ainda tentei com os meus sputnicks alcançar a parte de cima do cais da estação da CP, mas desconfio que o objetivo era pesquisar os ovos das pombas que por ali nidificavam. E desculpem a analepse. A concorrência, nessa época, entre as duas grandes potências, foi sempre proporcional ao meu sentido mimético. Nessa altura passei a equacionar que não haveria nada que o HOMEM não conseguisse atingir. Já era utopia a mais e tinha-se acabado a fase do mimetismo. Contudo, de forma percuciente, venho um dia a sentir-me fascinado com nova Odisseia: a da DESCODIFICAÇÃO DO GENOMA HUMANO. Obviamente mais jovem nessa época, há cerca de vinte anos, o geneticista e amigo PROFESSOR DOUTOR REGATEIRO concede-me uma entrevista que foi publicada num diário nacional o qual, excecionalmente, autorizou-me a ocupar mais espaço do que o habitual e o título foi mais ou menos este: A DESCODIFICAÇÃO DO GENOMA HUMANO É TÃO OU MAIS IMPORTANTE DO QUE A CONQUISTA DA LUA. Uáu! De novo em fase de sonho? Foi há menos de cinquenta anos e já não sei há quantas ovelhas escocesas Dollies passadas. Não fui muito mais longe na alínea f) do liceu do que a Dissecação do Pombo no Laboratório (agora até há dissecações virtuais!)… e já quase na andropausa (e não sei quantos litros de testosterona a menos, ui! ui!) nunca me tinha sentido tão atraído por algo, como então fiquei com este título-parangona no jornal. Os estudos genómicos, fundamentais na EVOLUÇÃO HUMANA, estão a permitir avançar em diagnóstico e tratamento de várias doenças. Um homem até fica na lua ao saber isso, não acham?
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O tempo passa a correr. Ainda ontem assistia a alguns jogos da Mamã CARMO a encestar pelos pavilhões portugueses. Posteriormente esta campeã ficou ao serviço da Secretaria do ORGANISMO AUTÓNOMO DE FUTEBOL DA ACADÉMICA. Quantas vezes tentei que me desse um “FURITO” para eu brilhar no jornal A BOLA. Qual quê?! Profissional, eticamente exemplar, a MAMÃ CARMO defendeu intransigentemente o segredo profissional, a sua e nossa ACADÉMICA e “furos”… só na cesta do basquetebol sua modalidade referencial. Quis o Destino que tivesse tido como alunas no MIGUEL TORGA duas filhas da MAMÃ CARMO tão distintas, educadas, cativantes e excelentes em tudo como a sua Mãe. A MAMÃ CARMO esteve quase meio-século ao serviço da BRIOSA na Secretaria. Teve momentos muito difíceis pelos quais não devia ter passado. A MAMÃ CARMO é o paradigma da grande mulher-atleta, mãe e esposa dedicada, esmeradíssima profissional. Merece um lugar no pódio da Vida. Até na Lua. Sabe, Mamã Carmo, estou a escrever sob um eclipse da Lua, mas ela vai voltar a brilhar. Como a CARMO sempre brilhou. Intensamente! Como se fosse sempre lua cheia. Obrigado e um F.R.A! para quem merece milhões de vivas académicos.
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Prova de Aptidão Profissional a decorrer nas magnificentes instalações da BIBLIOTECA MUNICIPAL DE MONTEMOR-O-VELHO. A aluna da ESCOLA PROFISSIONAL defende a sua Prova subordinada ao tema DOENÇAS DESMIELINIZANTES – ESCLEROSE MÚLTIPLA. Vai completar o seu curso de Técnica Auxiliar de Saúde, equivalente ao 12.º ano. Diretor, professores, coordenadores de uma Escola humana, eficiente e acolhedora, assistem à bela exposição da aluna. Questionada, no final, a aluna explica que a opção profissional – e que a levou à mudança de um anterior curso para este -, foi o facto de ter uma pessoa da família a sofrer a doença e que o curso lhe conferiu competências para melhor apoiar essa pessoa. De súbito… uma pausa, voz embargada, uma lágrima corre teimosa e incontrolavelmente… uma pausa maior: “a doente é a minha mãe que está ali” e aponta para a última fila de cadeiras do auditório. No rosto daquela mãe correm, igualmente, lágrimas de agradecimento e ninguém, entre os presentes, fica indiferente. De repente um colega salta da cadeira, sobe ao estrado e entrega-lhe um lenço de papel. Em vez de concorrência houve COMPANHEIRISMO, SOLIDARIEDADE E LÁGRIMAS… tudo embrulhado em amor naquele singelo lenço. É assim a VIDA com os pés na terra… a olharmos a Lua… onde o Homem pôs o pé há cinquenta anos.