Um ano depois dos trágicos incêndios, a região Centro volta a ser fustigada, desta vez pelo furacão Leslie, que deixou um rasto de destruição por este vasto território na madrugada de sábado e no domingo. Ainda a recompor-se dos danos provocados pelas chamas, a região sofre agora mais um profundo abalo, numa manifestação clara do poder e da força imensuráveis dos fenómenos naturais.
Casas destruídas, carros danificados, quedas de árvores e outras estruturas, interrupções no fornecimento da energia elétrica, falhas nas telecomunicações, escolas encerradas, condicionamentos de toda a ordem na via pública, deslizamento de terras, e muitos, muitos outros sinais de destruição são evidentes um pouco por todo o lado e deverão deixar as suas marcas, durante algum tempo, na zona Centro do país. O distrito de Coimbra foi o mais afetado mas a tempestade atingiu também fortemente algumas zonas dos distritos de Aveiro, Leiria e Viseu, onde se registam danos consideráveis.
Logo após a tragédia, na segunda feira, o ministro do Planeamento e das Infraestruturas, Pedro Marques, anunciou em Condeixa-a-Nova, um dos concelhos afetados, que vão existir os recursos necessários para apoiar as populações e as autarquias afetadas pela tempestade Leslie. “Não pode deixar de haver recursos para a recuperação da normalidade de vida das famílias numa ocorrência destas e vamos ter os recursos necessários”, disse.
“A prioridade, evidentemente, é repor a normalidade da habitação das famílias, apoiar aqueles que precisam de alojamento temporário, apoiar também as empresas, sabendo nós que felizmente têm os seus seguros”, garantiu o ministro.
Coimbra faz levantamento dos prejuízos
Em Coimbra os sinas da destruição são evidentes em todo o concelho. A Câmara está a inventariar os danos provocados pela tempestade e, em Edital publicado, informou os interessados de que devem entregar a relação dos prejuízos sofridos nos serviços camarários até às 19h30 de hoje. Na sequência da tragédia ocorrida no fim de semana, o Município está a proceder ao “levantamento preliminar dos danos provocados pela tempestade em bens públicos e privados, designadamente equipamentos e infraestruturas públicas, equipamentos associativos, recreativos, desportivos, habitações, unidades económicas e IPSS [instituições particulares de solidariedade social]”, refere o anúncio.
Dos muitos estragos, de referir o estado em que ficou a Mata Nacional do Choupal, que deve permanecer fechada ao público nas próximas três semanas, já que foi atingida em 40 por cento da sua extensão à passagem da tempestade.
Os estragos foram também muitos em Cantanhede e levaram a Câmara a criar um gabinete de apoio às vítimas do furacão Leslie. “Este órgão tem como principal objetivo prestar informações e auxiliar a população, dentro das suas competências, na resolução dos problemas ainda existentes no concelho e levantamento dos estragos provocados pela passagem da tempestade”, refere a autarquia, considerando que esta medida serve para “facilitar a execução dos trabalhos de reparação, permitindo aos técnicos que andam no terreno, com maior fiabilidade e exatidão na identificação do cerne dos problemas, solucioná-los com a maior rapidez possível”.
Em Condeixa, o presidente da Câmara, Nuno Moita, estima que tenham sido provocados estragos superiores a 1,1 milhões de euros nos equipamentos municipais, como piscinas, estádio, edifício dos Paços do Concelho e nas estradas municipais e florestais. Realça também os prejuízos avultados registados em várias empresas, bem como nas estufas agrícolas e nas habitações particulares.
Figueira, Montemor e Soure fortemente atingidos
O concelho da Figueira da Foz foi também atingido por um rasto de destruição. Árvores caídas, carros danificados, telhados que voaram, postes derrubados, ruas irreconhecíveis deixaram num caos esta cidade que, de acordo com o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), registou uma rajada de vento que atingiu os cerca de 176 quilómetros por hora no sábado à noite, valor mais elevado registado em Portugal.
A tempestade Leslie provocou prejuízos superiores a 32 milhões de euros na Figueira da Foz, mais de 20 milhões dos quais em empresas, de acordo com uma estimativa preliminar, elaborada pela Câmara e divulgada na terça feira.
Em Mira os estragos foram também imensos e a Câmara está agora a proceder à inventariação dos muitos prejuízos registados em bens públicos e privados. No Município encontra-se também, até às 18h00 de hoje, um técnico da EDP, a quem os cidadãos podem apresentar as anomalias sofridas nas infraestruturas elétricas existentes.
Miranda do Corvo também não escapou e, depois dos fogos, foi agora o mau tempo que causou avultados prejuízos a alguns viveiristas do concelho, com estudas e outros equipamentos diversos completamente destruídos.
O Município de Montemor-o-Velho foi outro dos mais afetados, o que levou a autarquia a prolongar o Plano Municipal de Emergência e Proteção Civil ativo até terça feira. Perante a tragédia, o presidente Emílio Torrão enaltece a “grande lição de união e humildade” que o concelho deu “nestas horas muito difíceis” e nestes dias em que se tem procurado repor a normalidade. Casas danificadas, escolas encerradas, campos agrícolas afetados e colheitas completamente destruídas são apenas alguns dos prejuízos causados pelo Leslie neste concelho.
Na Lousã a autarquia está também a apoiar os munícipes, instituições e empresas do concelho que tenham registado prejuízos na sequência da tempestade Leslie. Embora a decisão do eventual apoio financeiro às vítimas da tempestade não caiba ao Município, já que é da competência da Administração Central, a Câmara da Lousã está a assegurar esta ajuda, organizando os dossiês com vista a submeter os pedidos de apoio à apreciação/validação do organismo do Estado com poderes para o efeito.
A Câmara de Penacova criou também um gabinete de apoio aos munícipes, empresas, associações, coletividades e IPSS’s, bem como outras entidades que tenham registado prejuízos. Os prejuízos registados serão depois reportados para a Comissão de Coordenação Regional do Centro (CCDR-C).
A passagem do furacão também não poupou Soure, onde se estima que os prejuízos possam ultrapassar o milhão de euros em equipamentos municipais. Segundo o presidente da Câmara, Mário Jorge Nunes, numa primeira análise, os equipamentos municipais mais afetados são os pavilhões desportivos, o edifício da cadeia onde funcionam os serviços municipais técnicos, de ação social e juventude, o edifício dos Paços do Concelho e as oficinas municipais. Além disso, “há todo um conjunto de equipamento urbano: abrigos de autocarros, ecopontos e sinalética, que ficaram destruídos no concelho”.
Soure decretou mesmo o estado de calamidade pública, já que 90 por cento das habitações de oito das suas 10 freguesias sofreram danos na sequência do furacão, obrigando ao realojamento de várias famílias. Criou também um gabinete de atendimento para auxiliar os munícipes e estima que, no total, os prejuízos possam ascender aos sete milhões de euros.
A passagem do furacão Leslie por Portugal, no sábado e domingo, onde chegou como tempestade tropical, provocou 28 feridos ligeiros e 61 desalojados.
O especialista em alterações climáticas, Filipe Duarte Santos, alertou, esta terça feira, para o facto de tempestades como o Leslie poderem ser mais frequentes devido ao aquecimento da água dos oceanos, sendo difícil prever quando se podem repetir. “Nós não sabemos quando é que uma coisa destas vai acontecer outra vez mas é muito provável que passem a ser mais frequentes no futuro. É surpreendente que Portugal e a restante Europa sejam afetados por estes temporais pós-tropicais, mas é por causa da temperatura da água do mar”, disse o especialista à Lusa.
Segundo Filipe Duarte Santos, o Leslie foi “um fenómeno oceânico que nasceu no Atlântico e que cresceu, dando origem a um ciclone tropical que se aproximou da costa portuguesa, mas que quando entrou em terra já era um temporal pós tropical, mas com ventos extremamente intensos”.