Por Margarida Mano
“O facto de reconhecer que, no mundo imenso da pobreza, a nossa própria intervenção é limitada, frágil e insuficiente leva a estender as mãos a outros, para que a mútua colaboração possa alcançar o objetivo de maneira mais eficaz.” Foram estas as primeiras palavras da Mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial dos Pobres, em 12 de novembro do ano passado.
E foi com este espírito que nasceu, em 1935, a Casa dos Pobres de Coimbra. Vivia-se naquela época um contexto de imensa pobreza por entre a população que, passado o flagelo da pneumónica (http://www.odespertar.pt/casa-dos-pobres-a-entranhada-solidariedade-da-malta-dos-jornais/), continuava em situação de profunda carência e mendicidade e dormia “nos bancos dos jardins orvalhados pela cacimba e estendidos na penumbra dos portais” (In Casa dos Pobres, Memória Descritiva, 1935). Um mundo imenso de pobreza e a consciência que “…para a sua manutenção dos pobres na casa … é necessária uma verba que nem o Governo Civil nem a Polícia têm disponível nos seus cofres. E, assim, embora se conte com o auxílio das estações superiores, tem de apelar-se para o público” determinaram a natureza associativa original e as inúmeras iniciativas sociais e ajudas que tornaram realidade a sua inauguração, a 08 de Maio, no Pátio da Inquisição.
Volvidos 80 anos, no início do século XXI, felizmente muito mudou na população portuguesa, mas o combate à pobreza continua a ser, ou a dever ser, uma causa nacional. Em 2017, segundo o INE, residiam em Portugal 2,4 milhões de pessoas em risco de pobreza ou exclusão social, o que correspondia a cerca de um quarto da população portuguesa. Nos grupos mais vulneráveis à pobreza ou exclusão social, encontramos as mulheres, as pessoas com mais de 75 anos e as crianças e jovens com menos de 18 anos. A esta dimensão da pobreza em Portugal, que tem vindo a apresentar valores sempre superiores à média da União Europeia, junta-se a incapacidade estrutural da sociedade moderna de adaptar as suas estruturas sociais à evolução das situações.
Volvidos 80 anos de serviço à nossa cidade e à nossa região, a Casa dos Pobres de Coimbra, que aloja hoje, lotando a sua capacidade máxima, 63 pessoas sem recursos, sem-abrigo, ou em situação de isolamento familiar, não consegue, infelizmente, dar resposta a uma lista de espera de mais de 400 pessoas carenciadas.
A forma como tratamos os mais frágeis, como os respeitamos e os valorizamos, é uma das formas de medir o grau de desenvolvimento da nossa comunidade. Uma comunidade saudável integra, acarinha e ajuda os que, entre nós, pela idade avançada, pela doença ou pela carência económica, se encontram numa situação de maior fragilidade. E é por isso que enquanto cidadãos de Coimbra não podemos desconhecer a Casa dos Pobres e o seu legado, que é como quem diz o legado daqueles que de forma generosa e desinteressada asseguraram com o seu trabalho e dedicação oito décadas marcadas pela vontade de promover a coesão social.
(Continua na próxima edição)