Por Clara Almeida Santos
Escrever sobre a Casa dos Pobres não é para mim uma tarefa fácil.
O que sei sobre esta obra sempre me chegou mais por testemunhos do que por experiência direta. Há muitos anos, ainda a Casa dos Pobres habitava o Pátio da Inquisição, passei lá algumas horas, por altura do Natal, na condição de membro de uma espécie de “coro” que se organizava para levar música a algumas instituições da cidade. Assim que esta obra existia por me lembrar de ver, desde pequenina, em casa dos meus pais, os papéis das quotas com o enigmático nome de “Casa dos Pobres”.
Muito mais recentemente, sobretudo desde a mudança para S. Martinho e ainda devido a questões familiares, comecei a conhecer um bocadinho melhor, ainda que em segunda mão, a história desta grande casa.
Até que, finalmente, e porque me comprometi a escrever umas linhas sobre a Casa dos Pobres, fui constatar o enorme trabalho que aqui se desenvolve, com olhos de ver e ouvidos de ouvir.
Encontrei na Casa duas metáforas (além de muita gente boa, trabalhadora, dedicada e comprometida).
A Casa dos Pobres é uma árvore.
Se dúvidas disso houvesse, logo na escadaria principal da Casa se conhecem alguns frutos. Uma enorme árvore pensada para o Natal mantém-se orgulhosa ano fora. E já ramificou para árvores mais pequenas. A copa e tronco da árvore maior são formados por dezenas e dezenas de rostos. Fotografias de rostos que habitam (ou habitaram) este espaço (e lhe conferem o seu sentido) constituem a matéria-prima desta árvore que é simultaneamente o resultado do trabalho manual que acontece na Casa.
As raízes desta árvore são evidentes. Afinal, é bem verdade que não há obra que resista e cresça sem fortes raízes, capazes de ir buscar o que é preciso para a alimentar. A Casa dos Pobres exibe com orgulho as suas raízes: no espaço polivalente que recebe, mensalmente, tantos amigos à volta da mesa, as paredes falam dessa história através de fotografias do fundador, dos diretores e beneméritos. Dizem-nos, com a tranquilidade que o tempo esculpe, que sem história e sem memória não há futuro.
A Casa dos Pobres é uma sopa da pedra.
Voltemos ao almoço mensal, na segunda terça-feira de cada mês. Na partilha do maravilhoso cozido à portuguesa, percebe-se melhor a lógica, ou melhor, a identidade, da Casa. Do lado de quem nos recebe, o voluntarismo e empenho que vai muito para além do que pode ser exigido, porque espontâneo, genuíno e bom. Do lado dos comensais, manifesta-se a vontade de participar na vida da Casa dos Pobres, no seu presente e no seu futuro. E, sobretudo, contam-se à mesa as histórias de como a casa cresce com o contributo de tantos amigos. De cada um de acordo com as suas capacidades e possibilidades e, sobretudo, com muita generosidade. Os exemplos são múltiplos e não refiro nenhum pois seria injusto mencionar apenas alguns ingredientes desta sopa da pedra (preciosa).
Termino com um grande obrigada ao meu sogro, que me foi falando da Casa dos Pobres (antes – muito antes – durante e depois do almoço no qual tive o gosto de participar) e ao Dr. Lino Vinhal, graças a cujo convite para escrever acabei por conhecer, agora por experiência própria, a Casa dos Pobres.