Portugal criou e foi aperfeiçoando, ao longo dos anos, um sistema público de saúde robusto, dinâmico, acessível a todos e em condições de igualdade: o Serviço Nacional de Saúde (SNS). Desde a sua criação, o SNS tem incrementado a qualidade dos recursos de saúde e assumido um papel ímpar na coesão e justiça social. Mas nem sempre assim foi. A responsabilidade do Estado em proporcionar cuidados de saúde é uma conquista recente que fez o seu caminho nos países ocidentais, durante o último século.
A era industrial, do final do século XIX, obrigou alguns governos europeus a assumir um sistema de cuidados de saúde para minimizar o impacto da doença sobre os trabalhadores e, assim, garantir altos níveis de produtividade e diminuir o absentismo.
O pós-guerra, nos anos 50, trouxe novas preocupações económicas e sociais, permitindo acelerar o desenvolvimento de sistema de saúde sustentados pelo Estado. O National Health Service do Reino-Unido, do qual se inspirou Portugal no pós–25 de Abril, deu os seus primeiros passos no final dos anos 40.
Nem sempre a inspiração dos países que adotaram um sistema de saúde foi social e solidária. Frequentemente, existiu um interesse económico e financeiro. Uma população saudável tem menos absentismo no trabalho, maior capacidade laboral e também maior poder de compra. Mas, independentemente do motivo, estas transformações construíram décadas de conquistas sociais e alentaram a esperança de uma sociedade mais justa e mais solidária.
Em Portugal, as legislações de 1978 e 1979, responderam à necessidade de uma sociedade que se queria mais igual e solidária. A Saúde deixava de ser o privilégio dos afortunados ou dos ricos e passava a estar incluída nos direitos individuais de todos. A Lei Arnaud e a criação do Serviço Nacional de Saúde foram marcos históricos da democracia e talvez das suas maiores e mais estáveis conquistas.
Os ganhos em saúde foram notórios. O aumento da esperança de vida, de 60,7 anos nos anos 70 para 80,4 anos em 2014, ou a diminuição da taxa de mortalidade infantil, de 55 por cento para 2,9 por cento em 2015, são indicadores que ilustram bem o percurso de sucesso que percorremos nas últimas décadas.
O SNS está a atravessar muitas dificuldades, reconhecidas por todos. O caminho não tem sido fácil. Mas, continua a ser dos marcos mais importantes do avanço civilizacional do último século. Temos de o preservar como tal.
CARLOS CORTES (presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos)