Pintor assaz, diferente, que se fez rodear nos seus trabalhos de uma segurança professoral e duma forçosa ortodoxia conceitual. Percorria as ruas da cidade com os seus desenhos debaixo do braço, observava, apontava, falava com o semelhante numa filosofia contida, refletida, numa humildade exemplar mas cultora de máximas, de paradoxos, de considerações complementares para os audientes e para os artistas sempre que o rodeavam e Adriano Costa único na sua misantropia e nas suas andanças pela cidade na recolha, no apontamento.
A lápis ou carvão colhia a atmosfera dos monumentos, igrejas, fontes, nichos, pelourinhos e explicou as características e os fundamentos de um novo género de pintar, a lápis, carvão, pastel, como um cineasta retratava o movimento, a “coisa criadora”, numa espécie de uma formação científica em o desenho ser a base de toda a pintura, o seu orgulho, ou a esperança de as artes plásticas serem objetiva-subjetivamente a força importante da cultura e do diálogo franco entre os homens de boa vontade.
Adriano Costa foi um filósofo epicurista, ou uma lenda carregada de belos e inéditos desenhos debaixo do braço e que foram o seu orgulho, a sua vida, e nunca se recusou a ensinar nas ruas, avenidas ou praças a multidão que o rodeava sempre. Vê-lo desenhar a Igreja de Santa Cruz, os Olivais, tudo o que existe de mais monumental e historicamente válido, aquele traço que deslizava à primeira, foi para todos um regalo para a vista e para o espírito.
Simples. Falava o essencial mas gostou sempre de ensinar ao ar livre, nas escadas da Faculdade de Letras, Jardim Manuel Braga, nas próprias Ruas da Sofia, Ferreira Borges, Portagem. Quando artistas de certo nome lhe pediam um traço, uma resposta, um conselho, num ensino invulgar proferido pelo pedagogo que tinha a rua por laboratório.
Instruído, ensinava novas experiências e a pintura era tarefa anelante de toda a literatura.
Conhecia como poucos a história da arte, desde os antigos gregos à renascença e aos dias de hoje.
Criticava nas suas conversas a introspeção e afirmava que o diálogo era o melhor método para a pesquisa psicológica. E afirmava que a pintura moderna não pode avançar sem a psicologia.
Dispensava grande respeito pelo pensamento dos seus contemporâneos e lia Miguel Torga, Lobo Antunes, Saramago, Arnaut, este ainda no princípio de autor, Camus, o próprio Sartre e outros, numa ânsia de conhecer melhor o mundo.
Figura singular! Foi exemplo para muitos dos mais famosos pintores de Coimbra, alguns já não fazem parte deste mundo transviado!
Numa ida à cidade do Porto para desenhar e recolher material para futuros trabalhos a parca, essa morte inesperada, e arbitrária apanhou-o desprevenido numa rua e lá ficou o artista que amou Coimbra, a sua amada terra, mas ainda se impõe a sua “presença” numa teoria explicativa como referência sentimental, sociológica, do filósofo errante pelas nossas ruas que repudiava os narcisistas, as glórias efémeras, os tartufos da arte.
Modestamente vestido. Despreocupado com a vestimenta não foi escravo das conveniências sociais.
Lembra Utrillo, o pintor francês no seu conceito social e ambos percorreram as ruas das suas cidades, Coimbra e Paris, na busca da inspiração para os seus trabalhos
Expressionista viveu com angústia a queda da pintura, da cultura plástica com intrusos a lembrar algumas personagens de Dostoievski ou de Camilo, espíritos vulgares em atitudes extravagantes na galeria romanesca do escritor russo e do nosso Camilo Castelo Branco.
A sua linguagem simples teve sempre um timbre académico. De um pedagogo!
E os seus desenhos e o seu ensino palas nossas ruas, foi de fato uma viva pedagogia ao ar livre.
Como Sócrates, o grego, ensinou nas praças, ruas ou ruelas num intelecto ativo que marcou uma geração!