5 de Novembro de 2024 | Coimbra
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Orlando Fernandes

A semana a semana: a Alternativa

25 de Novembro 2022

De novo, o primeiro-ministro saiu por cima do debate parlamentar, na discussão na generalidade da proposta do Orçamento do Estado para 2023. É verdade que o modelo de organização do debate favorece sempre os governantes. É também certo que António Costa tem uma experiência parlamentar e política com décadas. Mas já era altura de o PSD se apresentar mais bem preparado para ocupar o seu lugar de principal partido da oposição. Luís Montenegro está em pleno exercício da liderança desde o Congresso do Porto, no início de Julho, mas o PSD continua a deixar-se enredar pelo Governo e pelo PS e a dançar no Parlamento a música que António Costa escolhe.

O Governo chegou ao Parlamento para discutir o primeiro Orçamento do Estado feito por completo sob coordenação directa do novo ministro das Finanças Fernando Medina, e com o respaldo parlamentar da maioria absoluta de 120 deputados do PS. Isto porque o Orçamento do Estado deste ano, aprovado já em Maio, era no fundo o guião das contas púbicas que foi chumbado em 27 de Outubro de 2021.

É um Orçamento que aposta na redução do défice e da percentagem da dívida em relação ao PIB, tendo o primeiro-ministro afirmado claramente que pretende trazer a dívida para menos de 100%, até ao fim da legislatura. Assim como assumiu que este Orçamento era o primeiro passo de um projecto de quatro anos.

Mas: o Governo chegou ao debate do Orçamento na generalidade com um acordo plurianual assinado na Concertação Social e outro acordo também plurianual com sindicatos representativos da função pública, que envolve não só aumentos, mas que prevê a revisão da progressão nas carreiras. Ou seja, o Governo ia calçado não só pela base parlamentar maioritária, mas também com a legitimidade social de ter assinado o terceiro acordo plurianual de concertação social e democracia – os outros foram em 1991 e 1996 – e um acordo plurianual com a função pública, o que não acontecia desde 1999.

Perante isto, o PSD ignorou a importância política dos acordos plurianuais e olhou com desconfiança para a chamada “política das contas certas”. Uma política que mais não é do que a obediência aos critérios de gestão financeira da União Europeia desde o estabelecimento do Tratado Orçamental. Critérios esses que o próprio PSD já seguiu quando Governo, entre 2011 e 2015.

No Governo de Pedro Passos Coelho, aliás o PSD executou o resgate do Estado português e cumpriu o guião previsto no acordo com a Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional, assinado pelo primeiro-ministro e líder do PS José Sócrates. Então, Passos Coelho conseguiu que o défice de 11%, em 2011, ficasse abaixo dos 3%, em 2015, deduzindo o impacto orçamental da intervenção do Estado no Banif. Uma “herança” que o PSD não tem sabido defender, antes parece continuar a querer disfarçar, cada vez que o primeiro-ministro, António Costa, usa como arma política a leitura hiperdepreciativa da governação de Passo Coelho.

O problema do PSD não é apenas o de não conseguir inverter a “narrativa” sobre a governação de Passos Coelho, a questão é que a liderança de Luís Montenegro não consegue avançar com propostas alternativas às do Governo de António Costa. Se fosse governo, a direcção do PSD sabe que teria a mesma “política de contas certas” que o actual executivo tem. O que falta é que o PSD diga, de forma clara, qual a forma alterativa como geriria a despesa e o investimento público e que apostas faria nas várias áreas de governação. Não basta lançar críticas.

Era importante, não só para o PSD, mas sobretudo, para debate político e para a democracia portuguesa, que a direcção de Luís Montenegro tivesse mais iniciativa, como teve, aliás, quando avançou com um pacote de medidas de apoio social contra os efeitos da inflação, na Festa do Pontal, antecipando-se ao Governo.

O facto de Luís Montenegro liderar o PSD sem ser deputado é, por si, prejudicial à afirmação política do maior partido da oposição. Mas o PSD devia ter apresentado já as suas ideias, as suas propostas para a gestão do Estado e não se reservasse para apenas avançar com propostas de alteração do Orçamento do Estado, durante a fase de especialidade. Propostas essas cujos temas se conhecem de forma genérica, mas não de forma concreta o seu conteúdo.

Faz falta à política portuguesa que o maior partido da oposição, o PSD, a lidere sem temores e hesitações. Em vez de se enredar em declarações vagas ou ocas sobre o seu projecto para o país e de apenas se limitar à exploração da chamada “política de casos”.

Por agora, a liderança e Luís Montenegro – que até parecia no início que queria estabelecer a diferença e levantar o partido – continua a derrapar, sem se afirmar como verdadeira alternativa. Assim, o país e o sistema democrático português continuam à espera da alternativa defendida pelo PSD.


  • Diretora: Lina Maria Vinhal

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